Apenas poucos dias se passaram do pedido de renúncia da cátedra de Pedro pelo Papa Bento XVI e começa uma melhor reflexão sobre o alcance profético e o verdadeiro sentido de sua renúncia.

Não se trata de negar em nada os reais problemas internos e externos da Igreja que o Papa admitiu haver e que os enfrentou com toda coragem. Suas palavras na abertura da quaresma são por demais claras: “Basta de hipocrisia, de vida dúbia, precisamos todos de conversão”, principalmente a nível interno de serviços na Igreja de Cristo. Os ministérios na Igreja existem como serviço a serem assumidos no amor gratuito a Cristo e aos irmãos, jamais como promoção pessoal. É isto que o Papa nos ensina com seu gesto de renúncia. “Somos apenas servos inúteis, fizemos o que deveríamos fazer”,(Lc 17,10).

A opção de Bento XVI não foi resultado de fraqueza pessoal e nem de pressão externa ou interna, mas uma expressão de grande fé, de sua maturidade e sabedoria teológica de homem humilde, sábio e santo no amor a Cristo e a Igreja. Aliás, sua vida toda foi marcada pelo espírito de renúncias.

Diante da realidade que nos encontramos temos que ter o olhar da razão que não pode negar os reais problemas e pecados na vida da Igreja. Mas particularmente temos que ter o olhar da fé que nos faz ver que através de tudo, mesmo de nossos limites, fraquezas e situação de pecado, Deus nos fala e quer nos ensinar. A opção de renúncia de Bento XVI ao papado é um sinal de Deus que nos fala, nos questiona e nos ensina muito.

Segundo as próprias palavras de Bento XVI “devemos evitar o falso pessimismo de que tudo vai mal, como o falso otimismo que não vê os reais problemas”. Temos sim que saber que no horizonte da fé “tudo contribui para o bem dos que amam a Deus”, (Rm 8,28). O amor e a misericórdia de Deus nas horas de dor, de fraquezas e de pecado é a verdade presente no anúncio de todos os homens e mulheres de Deus do AT e do NT, na vida de nossos santos, nos ensinamentos da Igreja, particularmente na vida e na Boa Nova de Cristo. Não se trata de justificar o injustificável. Mas trata-se de entendermos a pedagogia de Deus que sempre nos ensinou e nos ensina através dos acontecimentos, mesmo que estes sejam provenientes de nossas fraquezas e quedas. É no horizonte da fé que somos chamados a entender a renúncia do Papa como um ato profético que somente o tempo o revelará em seu alcance maior para o bem da Igreja.

O caminho do silêncio

Bento XVI como grande teólogo serviu e serve a Igreja como poucos. Sua renúncia ao ministério maior da Igreja, a cátedra de Pedro, abre horizontes novos e sem precedentes para a Igreja. Temas, não da essência do cristianismo e da revelação, mas aparentemente intocáveis por momento, podem ser revistos para o bem da Igreja sob a luz do Espírito Santo que tudo ilumina, guia e transforma. Esta é a verdade. Sua renúncia fala abertamente da gratuidade do serviço na Igreja de Cristo. O espírito dos Evangelhos e dos ensinamentos do Concílio Ecumênico Vaticano II se transformou em uma realidade concreta com sua opção de renúncia.

Há duas formas de vivermos o amor e o martírio na Igreja. O Papa João Paulo II o encontrou na entrega pessoal até seu último momento de vida. Bento XVI escolheu o caminho do silêncio de um Carmelo, no anonimato da vida pública, dedicando-se à oração no amor a Cristo, a Igreja e aos irmãos. É assim que os profetas, os santos e os místicos começaram a renovar a vida da Igreja através dos tempos, pelo caminho do silêncio na escuta da vontade de Deus.

Não há nada a temer. A Igreja não é uma invenção humana que depende apenas de homens e de mulheres por mais santos que sejam para sobreviver. Ela é acima de tudo uma iniciativa do amor do Pai em Cristo na ação do Espírito. Nada a destruirá no tempo apesar da fragilidade humana. “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as forças do inferno jamais prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino do Céu: tudo o que ligares na terra será ligado nos céus e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus”, (Mt 16,18-19). Esta é a promessa de Cristo e a certeza de nossa fé e esperança.

Que o gesto de renúncia de Bento XVI, a caminho da Páscoa do Senhor, nos ensine a viver o verdadeiro espírito de serviço e de amor fraterno no seguimento de Cristo.

Padre Evaristo Debiasi
Assistente Eclesiástico Nacional

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Um comentário

  1. Lucimare de Almeida 2 de março de 2013 at 01:50 - Responder

    Palavras sensatas e consoladoras. Penso que o gesto do Papa Bento XVI irá fortalecer a nossa fé. Eu creio nisto, e na ação do Espírito Santo na vida da Igreja!!

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