Maldivas

LIBERDADE RELIGIOSA NO MUNDO
RELATÓRIO 2023

POPULAÇÃO

458.909

ÁREA (km2)

300

PIB PER CAPITA

15.184 US$

ÍNDICE GINI

29.3

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Religiões

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Disposições legais em relação à liberdade religiosa e aplicação efetiva

As Maldivas são conhecidas como um destino turístico internacional. No entanto, poucos dos quase 1,5 milhão de turistas que visitam as Maldivas todos os anos têm qualquer contato com a realidade da vida num país onde o Islã sunita é a religião oficial e no qual apenas os muçulmanos sunitas podem ser cidadãos. De acordo com o artigo 2.º da Constituição de 2008,1 as Maldivas são “uma República soberana, independente e democrática, baseada nos princípios do Islã”. A alínea a) do artigo 10.º da Constituição estipula que “a religião do estado das Maldivas é o Islã”. Constatando que o Islã é central na estrutura jurídica do país, a alínea d) do artigo 10.º acrescenta: “Nenhuma lei contrária a qualquer princípio do Islã será promulgada nas Maldivas”.

Segundo a alínea d) do artigo 9.º, “um não muçulmano não pode tornar-se cidadão das Maldivas”, razão pela qual as Maldivas afirmam ter uma população 100% muçulmana. No entanto, estas estatísticas oficiais ignoram a presença de até 95.000 imigrantes, ou 25% da população total, principalmente do Bangladesh, Índia, Sri Lanka e Filipinas,2 muitos dos quais não são muçulmanos.

A Constituição das Maldivas não inclui proteções para a liberdade religiosa. No entanto, o artigo 27.º protege o direito à liberdade de pensamento e à liberdade de comunicar as suas opiniões e de se expressar, embora “de uma forma que não seja contrária a qualquer princípio do Islã”. O artigo 19.º, que trata das restrições à liberdade, estabelece: “O cidadão é livre de se envolver em qualquer conduta ou atividade que não seja expressamente proibida pela sharia islâmica ou pela lei”. As alíneas f) e g) do artigo 67.º mencionam que é da responsabilidade dos cidadãos das Maldivas “promover os valores e práticas democráticas de uma forma que não seja incompatível com qualquer princípio do Islã” e “preservar e proteger a religião estatal do Islã, a cultura, a língua e o patrimônio do país”. Nos termos do artigo 100.º (alínea a, n.º 1), o presidente e o vice-presidente podem ser destituídos do cargo por uma resolução do Parlamento em caso de “violação direta de um princípio do Islã”.

Em conformidade com a alínea c) do artigo 70.º, o Parlamento “não aprovará qualquer lei que viole qualquer princípio do Islã”. O artigo 142.º exige que os juízes tenham em conta a sharia para resolver questões não abrangidas pela Constituição ou pelo sistema judicial.

A alínea a) do artigo 274.º da Constituição define o “princípio do Islã” da seguinte forma: “O Alcorão Sagrado e aqueles princípios da sharia cuja proveniência não está em disputa entre os que se encontram na Suna do Nobre Profeta, e aqueles princípios derivados destes dois fundamentos”. O termo “sharia islâmica” é definido como: “O Alcorão Sagrado e os caminhos preferidos pelas pessoas cultas dentro da comunidade e seguidores da Suna em relação a assuntos criminais, civis, pessoais e outros encontrados na Suna”.

Para além das restrições no âmbito da Constituição, a Lei de Proteção da Unidade Religiosa de 1994 regula a prática e pregação do Islã e limita a prática e expressão de outras religiões para além do Islã sunita.3

De acordo com o artigo 2.º, é necessária autorização governamental para sermões, conferências e publicações islâmicas. Segundo o artigo 4.º, estes sermões, conferências ou doutrinas não devem contradizer a ortodoxia sunita tal como interpretada pelo Governo. O artigo 4.º também proíbe a pregação por outras religiões. De acordo com o artigo 6.º, “é proibido propagar uma fé diferente do Islã ou fazer qualquer esforço para converter alguém a uma religião diferente do Islã. É igualmente ilegal exibir em público símbolos ou slogans pertencentes a uma religião que não o Islã, ou gerar interesse nos mesmos”. Segundo o artigo 7.º, é também ilegal “transportar ou exibir em público livros sobre outras religiões (para além do Islã), livros e textos que promovam e propaguem outras religiões, bem como a tradução para dhivehi [a língua oficial das Maldivas] desses livros e textos relacionados com outras religiões”.

Nos termos do artigo 9.º, é ilegal que residentes ou visitantes não muçulmanos expressem publicamente a sua fé de qualquer forma. Além disso, de acordo com o artigo 10.º, “é ilegal possuir, distribuir ou propagar programas, textos, obras de arte e publicidade sobre outras religiões que não o Islã”. A pena por qualquer violação destas disposições legais, nos termos do artigo 12.º, é entre dois e cinco anos de prisão para os Maldívios. Os estrangeiros que violem ou infrinjam estas disposições “devem ser entregues ao Ministério da Imigração e Emigração para serem expulsos das Maldivas”.

A lei relativa à difamação criminaliza qualquer discurso, comentário, texto ou ação que seja considerado difamatório para com “todos os defensores do Islã”. Os potenciais infratores são punidos com multas que variam entre 50.000 rupias das Maldivas (2.680 euros) a dois milhões de rupias (108.895 euros), e penas de três a seis meses de prisão. As publicações, incluindo online, consideradas culpadas de acolher comentários “difamatórios”, podem ver as suas licenças revogadas.4

As Maldivas afirmam que os estrangeiros residentes no país podem praticar a sua religião em privado, mas muitos estrangeiros cristãos foram presos ou deportados por participarem num culto privado.5

Todos os visitantes das Maldivas são obrigados a assinar um formulário de imigração declarando que não transportam material pornográfico, ídolos, álcool, carne de porco ou “material contra o Islã”.6 Consequentemente, a importação oficial de Bíblias e literatura cristã é proibida.

Com a proibição governamental absoluta da expressão religiosa não muçulmana sob qualquer forma, não existe nenhuma igreja ou local de culto cristão no país. Os poucos cristãos das Maldivas não têm onde se encontrar e fazem o seu melhor para manter a sua fé em privado. Oficialmente, não há cristãos das Maldivas, apenas estrangeiros cristãos.7

Incidentes
e episódios relevantes

O atual Governo continua sob a liderança do presidente Ibrahim Mohamed Solih. No dia 17 de dezembro de 2020, foi aprovada legislação significativa, conhecida como a Lei da Justiça Transitória, que visa reparar as vítimas de abusos cometidos no passado por funcionários e instituições do Estado. Estas podem assumir a forma de indemnização monetária, reabilitação, resolução e restituição.8

Apesar desta reforma positiva e da promessa do Governo de Solih de travar o terrorismo, o período em análise registrou um número significativo de incidentes.

As Maldivas continuam a ser um famigerado local de recrutamento de terroristas. Um estudo do Grupo Soufan revelou níveis elevados de recrutamento do autoproclamado Estado Islâmico (EI) entre os maldivos já em abril de 2016.9 Graffiti nas paredes em diferentes atóis apelavam às pessoas para se juntarem ao EI. O comissário da polícia do país revelou em dezembro de 2019 que “quase 500 maldivos viajaram, ou tentaram viajar, para a Síria ou para o Iraque” durante os anos de pico do poder e da expansão do autoproclamado Estado Islâmico, entre 2014 e 2018. Per capita, isto faz das Maldivas uma das principais fontes mundiais de combatentes terroristas estrangeiros islâmicos.10

Há muitas provas de que o radicalismo islâmico continua a crescer, especialmente com a resposta inconsistente do Governo de Solih ao problema. Particularmente problemática para a liberdade religiosa e para a transição do país para a democracia é a influência das organizações islâmicas conservadoras, incluindo o Partido Adhaalath. Em setembro de 2019, o Governo dos EUA alegou que um maldivo, Mohamad Ameen, era um “líder-chave do autoproclamado Estado Islâmico na Síria, no Afeganistão e nas Maldivas” e que, em abril de 2019, tinha estado ativo no recrutamento de jihadistas na capital das Maldivas, Malé.11 No dia 3 de outubro de 2021, o Supremo Tribunal anulou a decisão do Tribunal Superior que rejeitou as acusações contra Ameen, que não pode sair do país e se encontra em prisão domiciliária das 18h00 às 06h00 da manhã.12

No dia 7 de maio de 2021 houve uma tentativa de assassinato do atual presidente do Parlamento, Mohamed Nasheed, que foi descrita como “um ataque à democracia e à economia das Maldivas”.13 Mais recentemente, em 22 de agosto de 2022, o ministro das Maldivas, Ali Solih, foi esfaqueado por um homem que recitava versos do Alcorão, que apontou para o pescoço, mas falhou e acertou-lhe de raspão no braço esquerdo.14

Em 21 de novembro de 2021, um ativista da liberdade religiosa, Mohamed Rusthum Mujuthaba, foi detido sob a acusação de ter criticado o Islã e de estar na posse de material obsceno. No dia 10 de agosto de 2022 declarou-se culpado das acusações e foi condenado a quatro meses de prisão, mas foi libertado, uma vez que já tinha sido preso por seis meses.15

No dia 8 de fevereiro de 2022, o Clique College foi alvo de uma investigação quando uma canção com letra cristã foi tocada durante um festival desportivo para crianças. O Colégio alegou que a canção foi reproduzida automaticamente a partir de uma lista de reprodução e recusou responsabilidade pelo “erro”.16

Em 24 de maio de 2022, um homem entrou à força na escola primária de Jamaluddin gritando “Allah Akbar”. Tentou atacar o diretor, aparentemente por considerar que o currículo da escola era depreciativo em relação ao Islã. O currículo educativo das Maldivas tem sido alvo de críticas, segundo as quais “os atores religiosamente conservadores conseguiram transformar o currículo escolar numa questão religiosa e política, sendo os que o criticam frequentemente rotulados de hereges”. Foi o caso da Maldivian Democracy Network (MDN), cujo registro foi cancelado em novembro de 2019, depois de ter publicado um relatório sobre o extremismo.17

No dia 21 de junho de 2022, a celebração do Dia Internacional do Ioga foi interrompida na capital, Malé, quando fundamentalistas religiosos entraram no estádio onde decorria o evento com bandeiras e cartazes condenando a prática de ioga. Gritando “Deus é grande” em árabe, foram rapidamente detidos pela polícia das Maldivas.18

Em 1º de julho de 2022, um homem com uma camisa com o logotipo do autoproclamado Estado Islâmico foi detido na mesquita King Salman depois de ter perturbado publicamente as orações de sexta-feira.19

Para além de outras consequências altamente prejudiciais para a estabilidade social e a liberdade religiosa do país, o radicalismo islâmico sem controle está a pressionar as mulheres a usarem hijabs, levando ao assédio social das mulheres que optam por não o fazer. Para as Maldivas, esta é uma nova tendência. Há apenas uma década, muito poucas mulheres usavam lenços de cabeça.20

Perspectivas para a
liberdade religiosa

Os direitos humanos não são uma grande prioridade do atual Governo das Maldivas, que está mais preocupado em fomentar as relações com a Índia e a China e em tentar libertar o país da “diplomacia da armadilha da dívida” chinesa criada pelo Governo anterior.

Devido ao crescente radicalismo islâmico, combinado com a apatia do atual Governo, as perspectivas para a liberdade religiosa nas Maldivas são negativas, exemplificadas pelos incidentes ocorridos durante o período em análise. O país carece de proteções constitucionais, aplica as leis de forma inconsistente, enfrenta uma poderosa corrente de extremismo islamista no âmbito social e é governado por líderes políticos pouco dispostos a travar o jihadismo e a realizar reformas políticas e religiosas significativas.

Notas e
Fontes

1 Maldives 2008, Constitute Project, https://www.constituteproject.org/constitution/Maldives_2008?lang=en (acessado em 8 de setembro de 2022).
2 Migration in Maldives: A Country Profile 2018, Organização Internacional para as Migrações (OIM), https://publications.iom.int/books/migration-maldives-country-profile-2018 (acessado em 8 de setembro de 2022).
3 Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, “2021 Report on International Religious Freedom: Maldives”, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2021-report-on-international-religious-freedom/maldives/ (acessado em 8 de setembro de 2022).
4 Carey Lodge, “Severe restrictions on religious freedom in the Maldives as defamation law passed”, Christianity Today, 10 de agosto de 2016, https://www.christiantoday.com/article/severe-restrictions-on-religious-freedom-in-the-maldives-as-defamation-law-passed/92829.htm (acessado em 8 de setembro de 2022).
5 2022 World Watch List, “Maldives”, Open Doors, https://www.opendoorsusa.org/christian-persecution/world-watch-list/maldives/ (acessado em 8 de setembro de 2022).
6 Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, op. cit.
7 Open Doors, op. cit.
8 Mushfiq Mohamed, “Unpacking the Maldives’ Transitional Justice Act”, Himal Southasian, 4 de junho de 2021, https://www.himalmag.com/unpacking-the-maldives-transitional-justice-act-2021/ (acessado em 8 de setembro de 2022).
9 “Azim Zahir, How the Maldives is failing to stem violent extremism”, 28 de abril de 2016, The Soufan Group, http://www.soufangroup.com/tsg-report-quoted-on-the-wire-politics-of-radicalisation-how-the-maldives-is-failing-to-stem-violent-extremism/ (acessado em 8 de setembro de 2022).
10Daniel Bosley, op. cit.
11 Paulo Casaca, “Focus 66 – The Maldives in the face of recurrent Jihadism”, South Asia Democratic Forum, 16 de setembro de 2020, https://www.sadf.eu/focus-66-the-maldives-in-the-face-of-recurrent-jihadism/ (acessado em 8 de setembro de 2022).
12 Zunana Zalif, “Supreme Court overturns lower court’s ruling to dismiss charge against terror suspect”, Raajje Television, 3 de outubro de 2021, https://raajje.mv/107405 (acessado em 8 de setembro de 2022).
13 “Mohamed Nasheed: Maldives ex-president in critical condition after bomb blast”, BBC News, 7 de maio de 2021, https://www.bbc.com/news/world-asia-57027873 (acessado em 8 de setembro de 2022).
14 “Maldivian minister STABBED in broad daylight, accused allegedly read Quran before attack”, Zee News, 23 de agosto de 2022, https://zeenews.india.com/world/maldivian-minister-stabbed-in-broad-daylight-accused-allegedly-read-quran-before-attack-2500811.html (acessado em 8 de setembro de 2022).
15 “Mohamed Rusthum Mujuthaba”, Humanists International, 15 de agosto de 2022, https://humanists.international/case-of-concern/mohamed-rusthum-mujuthaba/ (acessado em 8 de setembro de 2022).
16 Pastor Foley, “Maldives: Charges filed against college for playing a Christian song”, Do the Word, 8 de fevereiro de 2022, https://dotheword.org/2022/02/08/maldives-charges-filed-against-college-for-playing-a-christian-song/ (acessado em 8 de setembro de 2022).
17 Mushfiq Mohamed, “The islands of ideologies”, Himal Southasian, 23 de agosto de 2022, https://www.himalmag.com/himal-briefs-islands-of-ideologies-maldives-2022/ (acessado em 8 de setembro de 2022).
18 “Maldives religious extremists disrupt Yoga Day event”, AP News, 21 de junho de 2022, https://apnews.com/article/religion-arrests-indian-ocean-yoga-4e9851918dd31c0e5e06cfa5edaad9a5 (acessado em 8 de setembro de 2022).
19 Areeba, “JUST IN: Man Wearing IS shirt arrested at King Salman Mosque”, The Times of Addu, 1 de julho de 2022, https://timesofaddu.com/2022/07/01/just-in-man-wearing-is-shirt-arrested-at-king-salman-mosque/ (acessado em 8 de setembro de 2022).
20 Paulo Casaca, op. cit.

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