Zâmbia
LIBERDADE RELIGIOSA NO MUNDO
RELATÓRIO 2023
POPULAÇÃO
18.679.273
ÁREA (km2)
752.612
PIB PER CAPITA
3.689 US$
ÍNDICE GINI
57.1
Disposições legais em relação à liberdade religiosa e aplicação efetiva
O artigo 19.º da Constituição da Zâmbia consagra a liberdade religiosa, incluindo o direito de mudar a própria fé religiosa, o direito a expressar publicamente a própria fé e a propagar a própria religião.1 Em 1996,2 o preâmbulo foi alterado para reconhecer a Zâmbia como um país cristão. Embora isto torne a Zâmbia num estado confessional cristão, a Constituição garante a proteção dos não cristãos, a quem é dado o direito de seguirem a religião à sua escolha. Não há outras leis no país que cerceiem esta liberdade religiosa.
Os cidadãos são livres de se converterem a uma religião à sua escolha. As Igrejas são livres de evangelizar abertamente, de construir locais de culto, de realizar trabalho pastoral e catequético e de angariar fundos dentro do país, bem como de solicitar e receber fundos do estrangeiro. A legislação da Zâmbia proíbe a discriminação no local de trabalho, incluindo a discriminação por motivos religiosos.3
A instrução religiosa é obrigatória do 1.º ao 9.º ano, com o currículo centrado no Cristianismo, mas incluindo elementos de outras religiões.4 Nos termos do n.º 3 do artigo 19.º da Constituição, os grupos religiosos podem disponibilizar a sua própria instrução religiosa e gerir as suas próprias escolas.5
O Ministério da Orientação Nacional e dos Assuntos Religiosos (MNGRA), que estava autorizado a supervisionar os assuntos religiosos e a promover os valores cristãos, foi abolido em setembro de 2021.6
Os grupos religiosos são obrigados a registrar-se junto do Registro das Sociedades, no Ministério dos Assuntos Internos, e são obrigados a formar ou aderir a uma única organização de cúpula, “que reúne igrejas e denominações individuais sob uma única autoridade administrativa”, vulgarmente conhecida como “organismo-mãe”.7 Existem sete organismos cristãos e sete não cristãos. A maior entidade administrativa cristã inclui: a Conferência Episcopal Católica da Zâmbia (ZCCB), o Conselho das Igrejas da Zâmbia (CCZ) e a Irmandade Evangélica da Zâmbia (EFZ).8 Nos termos do artigo 8.º da Lei das Sociedades, o Registro das Sociedades pode revogar o registro se um grupo religioso não pagar as suas taxas ou se constatar que o grupo tem, ou pretende ter, qualquer ação contrária aos interesses da “paz, bem-estar ou boa ordem”.9 O clero deve também receber formação formal.
Os grupos religiosos podem igualmente obter isenções fiscais, que se aplicam normalmente a organizações de “utilidade pública”, incluindo as que estão associadas a grupos religiosos.10
Depois dos Cristãos e das religiões tradicionais, os Bahá’ís são a maior comunidade religiosa da Zâmbia. O país também acolhe uma pequena comunidade muçulmana, centrada sobretudo em Lusaka e nas províncias do Leste e da Cintura do Cobre, constituída por imigrantes naturalizados (do Sul da Ásia, da Somália e do Oriente Médio) e por alguns naturais da Zâmbia. Existem ainda cerca de 10 mil hindus, maioritariamente com origem no Sul da Ásia.11
Incidentes
e episódios relevantes
A sociedade zambiana é tradicionalmente tolerante em termos de religião. Durante o período abrangido por este relatório, o Governo respeitou, de um modo geral, a liberdade religiosa e as poucas violações deste direito revelam que, também a nível social, este direito é respeitado.
Em fevereiro de 2021, o Governo do presidente Edgar Lungu disponibilizou 25 milhões de Kwacha (1,5 milhões de dólares) como um “fundo de capacitação”, um pacote de apoio à COVID-19 para igrejas, organizações religiosas e organizações de fé. Godfridah Sumaili, o ministro da Orientação Nacional e dos Assuntos Religiosos, declarou: “Os fundos apoiarão os programas organizações já existentes que foram gravemente afetados, entre outros programas de capacitação”.12 Numa carta formal dirigida aos outros bispos, o Bispo George Lungu, presidente da Conferência Episcopal Católica da Zâmbia (ZCCB), respondeu que a ZCCB recusaria receber os fundos de capacitação. O bispo explicou que “a Igreja prefere que o mesmo dinheiro seja canalizado para outras áreas necessitadas, como o serviço da dívida, o pagamento aos reformados e aos trabalhadores […] e que o Governo canalize os recursos para o setor da saúde, para adquirir equipamento de proteção individual, medicamentos essenciais e para destacar mais colaboradores para a Câmara Municipal de Chipata, que está há nove meses sem receber salários”.13
Em 12 de agosto de 2021, na sequência de um aumento da violência e de uma repressão governamental contra os manifestantes da oposição, 11 bispos católicos da Zâmbia, liderados pelo presidente da Conferência Episcopal, D. Ignatius Chama, Arcebispo de Kasama, apelaram à realização de eleições pacíficas e justas. Os bispos apelaram à população para que apoie a filosofia política do país de “Uma Zâmbia, Uma Nação”, para que trabalhe para o bem do país e para que evite o derramamento de sangue por motivos políticos.14
Em 16 de agosto de 2021, o líder da oposição Hakainde Hichilema obteve uma vitória inesperada sobre o atual presidente Edgar Lungu nas eleições presidenciais da Zâmbia.15 O Arcebispo cessante, Telesphore Mpundu, apelou ao novo Governo para que cumpra as promessas de campanha, afirmando: “Quando as pessoas falam, é Deus que está a falar. A voz do povo é a voz de Deus, não a ignorem”.16 O presidente Hichilema elogiou o papel da Igreja Católica no país, descrevendo-a como “um farol de esperança” e destacando o seu papel nas “áreas da educação, da saúde e da promoção da democracia e da boa governação na Zâmbia”, e como defensora da justiça social.17
Em setembro de 2021, o presidente Hakainde Hichilema aboliu o Ministério da Orientação Nacional e dos Assuntos Religiosos e colocou as suas funções sob a alçada do Gabinete do vice-presidente. A decisão foi recebida com consternação por alguns e com alívio por outros. O porta-voz do Conselho de Pastores e Profetas (CPP), Bernard Katongo, elogiou a decisão, afirmando que o Ministério tinha permitido que “muitos clérigos falsos criassem muitas Igrejas sem estruturas físicas para se envolverem em atividades falsas a fim de enganar seguidores desavisados com falsos milagres”.18 O presidente das Igrejas Independentes da Zâmbia, David Masupa, declarou: “Sabemos que o Ministério pode ser considerado irrelevante pelo novo Governo, mas não o é. Para que o país alcance a tolerância zero em relação à corrupção, tem de haver uma inculcação de valores morais nas pessoas”.19
Em 18 de outubro de 2021, o presidente Hichilema “reafirmou a importância de declarar a Zâmbia como uma nação cristã” e afirmou que “a declaração não pode fazer cedências, uma vez que faz do povo Zambiano aquilo que ele é”.20
Em 19 de fevereiro de 2022, o Governo anunciou que iria apresentar ao Parlamento alterações à seção 6 do Código Penal que, entre outras disposições, eliminariam a criminalização do aborto e da bigamia. As propostas foram apresentadas pela Comissão de Desenvolvimento Jurídico da Zâmbia. O Conselho das Igrejas da Zâmbia (CCZ) opôs-se às alterações, afirmando que a revogação da seção 166 do Código Penal, que proíbe a bigamia e regula o acesso das mulheres grávidas ao aborto, é uma contradição ao estatuto de nação cristã da Zâmbia.21
Em fevereiro de 2022, o presidente reuniu-se com o Papa Francisco no Vaticano, onde também foram discutidas as contribuições da Igreja para o país, bem como o acesso às vacinas contra a COVID-19.22
Em maio de 2022, o presidente apresentou ao Parlamento um projeto de lei para pôr termo à pena de morte e comutou as penas de 30 prisioneiros no corredor da morte.23
Perspectivas para a
liberdade religiosa
Não obstante à pressão internacional sobre o patrimônio religioso e cultural tradicional da Zâmbia, o direito à liberdade religiosa é respeitado na Zâmbia, e é provável que esta situação se mantenha em um futuro próximo.
Notas e
Fontes
1 Zambia 1991 (rev. 2016), Constitute Project, https://www.constituteproject.org/constitution/Zambia_2016?lang=en (acessado em 13 de Novembro de 2022).
2 Constitution of Zambia (Amendment) Act, 1996 (No. 18 of 1996), Organização Internacional do Trabalho, https://www.ilo.org/dyn/natlex/natlex4.detail?p_isn=50029&p_lang=en (acessado em 13 de Novembro de 2022).
3 “Discrimination”, MyWage/Zambia, https://mywage.org/zambia/decent-work/fair-treatment/discrimination (acessado em 22 May 2022).
4 Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, 2021 International Religious Freedom Report, “Zambia”, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2021-report-on-international-religious-freedom/zambia/ (acessado em 13 de Novembro de 2022).
5 Zambia 1991 (rev. 2016), op. cit.
6 Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, op. cit.
7 Ibid.
8 Ibid.
9 “The Societies Act”, Assembleia Nacional da Zâmbia, https://www.parliament.gov.zm/node/862 (acessado em 13 de Novembro de 2022).
10 Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, op. cit.
11 Ibid.
12 “Government releases K 25 Million church relief package”, Lusaka Times, 21 de fevereiro de 2021, https://www.lusakatimes.com/2021/02/25/government-releases-k-25-million-church-relief-package/
13 “Chipata Catholics Reject Presidential Empowerment Funds”, Lusaka Times, 3 de Abril de 2021, https://www.lusakatimes.com/2021/04/03/chipata-catholics-reject-presidential-empowerment-funds/
14 “Bishops plea for peace, fair elections ahead of Zambia’s de agosto de vote”, Francis Njuguna, Catholic News Service, 21 de Julho de 2021,
https://catholicnews.com/bishops-plea-for-peace-fair-elections-ahead-of-zambias-august-vote/
15 Mfula, Chris, “Zambia opposition leader Hichilema wins landslide in presidential election”, Reuters, 16 de agosto de 2021, https://www.reuters.com/world/africa/zambian-opposition-leader-hichilema-heads-closer-victory-presidential-vote-2021-08-15/ (acessado em 27 de maio de 2022).
16 “Archbishop in Zambia Recalls Election Day, Says Zambians Had Chance for ‘no to impunity'”, Jude Atemanke, 2 de setembro de 2021, ACI Africa, https://www.aciafrica.org/news/4202/archbishop-in-zambia-recalls-election-day-says-zambians-had-chance-for-no-to-impunity
17 Kahiu, Magdalene, “Zambia’s president acknowledges Catholic Church as ‘beacon of hope, nation’s conscience’”, AciAfrica, 16 de fevereiro de 2022, https://www.aciafrica.org/news/5288/zambias-president-acknowledges-catholic-church-as-beacon-of-hope-nations-conscience (acessado em 29 June 2022).
18 “Clergymen in Kitwe welcome abolishment of Ministry of National guidance and Religious Affairs”, Lusaka Times, 20 de setembro de 2021, https://www.lusakatimes.com/2021/09/20/clergymen-in-kitwe-welcome-abolishment-of-ministry-of-national-guidance-and-religious-affairs/
19 “More Clergy Protest Religious Affairs Ministry Scrapping”, Ketra Kalunga, Daily Nation, 10 de setembro de 2021, https://dailynationzambia.com/2021/09/more-clergy-protest-religious-affairs-ministry-scrapping/
20 “President Hakainde Hichilema reaffirms the importance of declaring Zambia as a Christian nation”, Africa, 18 de outubro de 2021, https://www.africa-press.net/zambia/all-news/president-hakainde-hichilema-reaffirms-the-importance-of-declaring-zambia-as-a-christian-nation
21 “Penal code Proposed Amendments is a contradiction to Zambia’s Christian nation status-CCZ”, Lusaka Times, 22 de fevereiro de 2022, https://www.lusakatimes.com/2022/02/22/penal-code-proposed-amendments-is-a-contradiction-to-zambias-christian-nation-status/
22 “Pope Francis meets with President of Zambia”, Vatican News, 19 de fevereiro de 2022, https://www.vaticannews.va/en/pope/news/2022-02/pope-francis-meets-with-president-of-zambia.html (acessado em 29 de Junho de 2022).
23 “Zambia, Central African Republic move to abolish death penalty”, Death Penalty Information Center, 31 de maio de 2022, https://deathpenaltyinfo.org/news/zambia-central-african-republic-move-to-abolish-death-penalty (acessado em 30 de Junho de 2022).