Mauritânia
LIBERDADE RELIGIOSA NO MUNDO
RELATÓRIO 2023
POPULAÇÃO
4.783.767
ÁREA (km2)
1.030.700
PIB PER CAPITA
3.598 US$
ÍNDICE GINI
32.6
Disposições legais em relação à liberdade religiosa e aplicação efetiva
A República Islâmica da Mauritânia, situada na costa ocidental da África é na sua maioria desértica, pouco povoada e um dos países mais pobres do mundo. O país tem sido uma República Islâmica desde que conquistou a independência em 1960. O artigo 5.º da Constituição1 reconhece o Islamismo como a religião oficial do Estado e dos seus cidadãos.2
A Mauritânia é o único estado islâmico deste tipo na África após a Gâmbia ter voltado a ser uma república secular.3 Este fato, juntamente com o fato de a sua população ser quase inteiramente muçulmana, tem um profundo impacto na vida quotidiana do país.
Um relatório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos concluiu que a liberdade religiosa e de consciência não estão formalmente garantidas na Mauritânia, nem mesmo para os Muçulmanos.4 De fato, nenhuma destas liberdades é mencionada na Constituição. A não discriminação, que constitui a base da religião, também não é mencionada. A mudança de religião é tratada como apostasia e implica a pena de morte.5 O artigo 23.º defende que o presidente do país deve ser muçulmano.
O Ministério dos Assuntos Islâmicos e da Educação Tradicional é responsável por “decretar e divulgar fatwas, combater o extremismo, promover a investigação em estudos islâmicos, organizar as peregrinações Hajj e Umrah, e monitorizar as mesquitas”.6
O Código Penal da Mauritânia foi alterado em 2018 e a pena de morte foi tornada obrigatória em casos de blasfêmia, sem exceções.7 Antes desta alteração, o artigo 306.º do Código Penal só aplicava a pena de morte se o acusado se recusasse a mostrar remorsos ou a pedir desculpa. Agora isso já não é possível.8 A lei também inclui prisão até dois anos e uma pena pecuniária até 600 mil ouguiyas (14.549 euros) por “ofender a decência pública e os valores islâmicos” e por “violar as proibições de Alá” ou contribuir para a sua infração.9
As alterações foram feitas em resposta ao caso de Mohamed Cheikh Ould Mkhaïtir, um blogueiro mauritano que em 2014 escreveu um artigo crítico sobre o Islamismo. Foi inicialmente condenado à morte, mas, no dia 9 de novembro de 2017, um tribunal de recurso em Nouadhibou reduziu a pena para dois anos de prisão e uma multa.10 Muçulmanos devotos em muitas cidades da Mauritânia saíram à rua para protestar contra a decisão do tribunal e exigir que fosse imposta a pena de morte.11 A última vez que a pena de morte tinha sido executada no país foi em 1987.12
Relativamente à educação, tanto as escolas públicas como as privadas são obrigadas a disponibilizar instrução islâmica durante quatro horas por semana. As escolas internacionais são uma exceção, uma vez que não são obrigadas a ensinar a religião islâmica.13
Oficialmente, a população tradicionalmente nômade da Mauritânia é quase 100% muçulmana, quase exclusivamente sunita, e na sua maioria organizada em irmandades sufis14 como a Qadiriya, a Tijāniyyah e a Hamawiya.
O número exato de cristãos de etnia mauritana não é claro, pois, na cultura tribal, “deixar o Islã não é visto apenas como uma traição religiosa, mas também como uma traição à tribo e à família”.15 Consequentemente, os poucos não muçulmanos na Mauritânia não têm qualquer oportunidade real de viver a sua fé, pelo menos em público. A sharia (lei islâmica) é aplicada a questões civis, particularmente em questões familiares. Algumas infrações e certas violações da sharia são severamente punidas com flagelação, apedrejamento e amputação.16
Incidentes
e episódios relevantes
O direito humano da liberdade religiosa não é reconhecido. Os estrangeiros podem assistir livremente aos cultos, mas os cidadãos locais são impedidos de participar. “A ação não oficial do Governo limita efetivamente o culto cristão à Igreja Católica Romana e a um punhado de outras denominações. Estas Igrejas são impedidas de fazer proselitismo”.17 As igrejas encontram-se principalmente nas grandes cidades de Nouakchott, Kaedi, Atar, Nouadhibo e Rosso.
A Mauritânia acolheu vários simpósios e fóruns internacionais sobre a paz. O primeiro aconteceu em janeiro de 2021, onde o presidente Ghazouani presidiu à cerimônia de abertura sobre o papel do Islã na África.18 No final, foi publicada uma declaração conjunta, reforçando os ensinamentos de tolerância do Islã. No essencial, “o fórum explorou áreas de cooperação entre países islâmicos e publicou uma declaração delineando a importância da tolerância e da moderação no Islã na África”.19
Durante o relatório da Revisão Periódica Universal da Mauritânia (UPR) no Conselho dos Direitos Humanos da ONU – que analisa o respeito pelos direitos humanos em todos os 193 estados-membros da ONU de 5 em 5 anos –, Cheick Ould Mohammed Mkhaitir “denunciou violações contínuas dos direitos, incluindo a prática da escravidão e a perseguição de ativistas antiescravidão, no seu país natal, a Mauritânia”.20 Os delegados mauritanos rejeitaram as recomendações “para descriminalizar as suas leis de apostasia e blasfêmia ou mesmo para acabar com o uso da pena capital” para os nacionais declarando apenas: “Os estrangeiros na Mauritânia são livres de praticar as suas próprias religiões”.21
O último fórum de paz aconteceu em fevereiro de 2022 e intitulou-se “Making Peace for the World”. Foi organizado com financiamento dos Emirados Árabes Unidos. Durante este fórum, Rashad Hussain, embaixador americano itinerante para a liberdade religiosa internacional, disse que a paz é alcançável quando a liberdade religiosa é garantida. E observou: “A defesa mais forte contra a ameaça do extremismo violento e da instabilidade é proteger a liberdade de religião ou de crença para todos. A fim de contribuir plenamente para o desenvolvimento das suas próprias sociedades, todos devem ser capazes de pensar livremente, seguir a sua consciência, mudar as suas crenças se os seus corações e mentes os levarem a fazê-lo, e expressar essas crenças em público e em privado”.22
Perspectivas para a
liberdade religiosa
Pouco mudou em termos de vida religiosa e liberdade religiosa na Mauritânia. Qualquer desvio à crença islâmica é fortemente oposto no âmbito social e legal no âmbito nacional, e vivido de fato em comunidades e através da pressão familiar. Até a data, a Mauritânia tem resistido à propagação de outras formas de Islamismo extremista e de todas as formas de Jihadismo. Grupos terroristas ligados à al-Qaeda no Magrebe Islâmico (AQIM) e ao Movimento de Unidade e Jihad na África Ocidental (MUJAO) são particularmente ativos nas regiões fronteiriças orientais do país, mas até a data ainda não entraram na Mauritânia.
As perspectivas para a liberdade religiosa são negativas, uma vez que tal liberdade não é respeitada.
Notas e
Fontes
1 Mauritania’s Constitution of 1991 with Amendments through 2012, Constitute Project, https://www.constituteproject.org/constitution/Mauritania_2012.pdf?lang=en (acessado em 23 de fevereiro de 2022).
2 International Religious Freedom Report 2021, “Mauritania”, Gabinete de Democracia, Direitos Humanos e Trabalho, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2021-report-on-international-religious-freedom/mauritania/ (acessado em 29 de Julho de 2022).
3 Ver artigo 100.º (n.º 2, b), Gambia (The) 1996 (rev. 2018), Constitute Project, https://www.constituteproject.org/constitution/Gambia_2018?lang=en (acessado em 8 de Julho de 2022).
4 “Concluding Observations On The Second Periodic Report Of Mauritania”, Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, 23 de agosto de 2019, http://docstore.ohchr.org/SelfServices/FilesHandler.ashx?enc=6QkG1d%2FPPRiCAqhKb7yhsucPku6M9HJ11mkmOMrUQz6VY1gX9U92PK5y%2FWa3rdR20U3pbpGCUarEkGbGYJ1t2HrK5Kpyq3%2FGb%2B%2F6pCg5XEhOGQeuLGSPSjuLbMNakX%2Bd (acessado em 8 de Julho de 2022).
5 Ibid.
6 International Religious Freedom Report 2021, “Mauritania”, op. cit.
7 “Mauritania: mandatory death penalty for blasphemy”, Human Rights Watch, 4 de Maio de 2018, https://www.hrw.org/news/2018/05/04/mauritania-mandatory-death-penalty-blasphemy (acessado em 8 de Julho de 2022).
8 “Mauritanian authorities change legal code, could retry Mohamed Cheikh Ould Mohamed”, Committee to Protect Journalists, 20 de novembro de2017, https://cpj.org/2017/11/mauritanian-authorities-change-legal-code-could-re/ (acessado em 8 de Julho de 2022).
9 Ibid.
10 “Mauritanian blogger once sentenced to death is freed”, Voice of America, 30 de Julho de 2019, https://www.voanews.com/africa/mauritanian-blogger-once-sentenced-death-freed (acessado em 8 de Julho de 2022).
11 “Mauritania releases Facebook blogger convicted of blasphemy”, BBC News, 30 de Julho de 2019, https://www.bbc.com/news/world-africa-49165640 (acessado em 8 de Julho de 2022).
12 “Mauritania”, Death Penalty Database, https://dpw.pointjupiter.co/country-search-post.cfm?country=Mauritania (acessado em 8 de Julho de 2022).
13 International Religious Freedom Report 2021, “Mauritania”, op. cit.
14 “Brotherhoods and saints”, Mauritania A Country Study, Robert E. Handloff (ed.), Washington: GPO for the Library of Congress, 1988, http://countrystudies.us/mauritania/39.htm (acessado em 8 de Julho de 2022).
15 Ibid.
16 “Concluding Observations on the Second Periodic Report of Mauritania”, op. cit.
17 “Mauritania’s Apostasy Laws Threaten Religious Freedom”, The Institute of Religion & Democracy, 13 de agosto de 2021, https://juicyecumenism.com/2021/08/13/mauritania-religious-freedom (acessado em 26 de Dezembro de 2022).
18 2020 Report on International Religious Freedom, “Mauritania”, Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2020-report-on-international-religious-freedom/mauritania/ (acessado em 9 de Dezembro de 2022).
19 Ibid.
20 “Mauritania continues to persecute anti-slavery activists, Cheick Mkhaitir tells UN”, Humanists International, 9 de Julho de 2021, https://humanists.international/2021/07/mauritania-continues-to-persecute-anti-slavery-activists-cheick-mkhaitir-tells-un/ (acessado em 26 de Dezembro de 2022).
21 “Mauritania continues to persecute anti-slavery activists, Cheick Mkhaitir tells UN”, op. cit.
22 “AL Rashad Hussain Keynote Address at ‘Making Peace for the World’ Forum”, Embaixada dos EUA na Mauritânia, https://mr.usembassy.gov/aal-rashad-hussain-keynote-address-at-making-peace-for-the-world-forum/ (acessado em 23 de fevereiro de 2022).