Madagascar
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Disposições legais em relação à liberdade religiosa e aplicação efetiva

O artigo 1.º da Constituição de 2010 estabelece que Madagascar é um Estado laico. O artigo 2.º estabelece que o conceito de neutralidade do Estado em relação a todas as religiões assenta na separação entre o Estado e a religião. Nenhum funcionário público pode ocupar um cargo de responsabilidade numa organização religiosa. A liberdade religiosa é garantida pelos artigos 6.º e 10.º.[1]

Os grupos religiosos devem registrar-se junto do Ministério do Interior. A isenção de impostos para estes grupos pode ser solicitada no caso de doações nacionais e estrangeiras.[2] De acordo com a lei malgaxe, para serem legalmente registrados como entidades religiosas, os grupos devem ter pelo menos 100 membros e um conselho eleito com um máximo de nove membros, todos cidadãos malgaxes. Em 2023 existiam cerca de 400 grupos religiosos oficialmente registrados.[3] O ensino religioso não está incluído no currículo das escolas públicas.[4]

Uma alteração à lei da nacionalidade de Madagascar em 2017 permitiu que as mulheres transmitissem a sua nacionalidade aos filhos, independentemente do seu estado civil.[5] No entanto, a lei continua a prejudicar os muçulmanos, muitos dos quais têm dificuldades em obter documentos essenciais, como certificados de cidadania e cartões de eleitor.[6] Em Junho de 2021, o Parlamento do país decidiu adiar uma alteração à lei da nacionalidade de 2017, que concederia o direito de solicitar a cidadania a até 15.000 residentes apátridas. Os líderes muçulmanos criticam a lei porque esta afeta desproporcionalmente a comunidade muçulmana, impedindo os descendentes de imigrantes muçulmanos de obter a cidadania.[7]

Embora Madagascar se veja como um estado secular, a política e a religião continuam a misturar-se, com grupos e organizações religiosas, como o Conselho das Igrejas Cristãs em Madagascar (FFKM), a desempenhar um papel importante na política.[8] Isto manifesta-se no papel da FFKM em exigir que o Governo preste contas sobre questões de transparência e que o Estado se concentre nas reais necessidades do povo.[9]

Embora o Estado e a Igreja estejam separados, o atual Presidente, Andry Rajoelina, bem como os seus antecessores, “divulgaram a sua fé religiosa através do uso de expressões religiosas nos seus discursos”.[10]

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Incidentes e episódios relevantes

Em Dezembro de 2023, o Tribunal Constitucional Superior de Madagascar confirmou a reeleição do Presidente Andry Rajoelina, que tinha obtido aproximadamente 59% dos votos na primeira volta das eleições presidenciais realizadas a 16 de Novembro. A eleição foi marcada por controvérsia, com uma participação historicamente baixa de pouco mais de 46% e um boicote da maioria dos candidatos da oposição, que citaram irregularidades como intimidação de responsáveis pelas mesas de voto e uso indevido de recursos públicos.[11] Apesar destas preocupações e dos apelos formais para anular os resultados, o tribunal confirmou a vitória de Rajoelina, concedendo-lhe um terceiro mandato. A oposição, organizada pelo "Collectif des 10", recusou-se a reconhecer o resultado, alertando para uma potencial instabilidade política e acusando o Governo de orquestrar um "golpe institucional".[12]

Em 2023 e 2024, Madagascar sofreu graves desastres naturais, incluindo dois grandes ciclones tropicais em cada ano. Em Março de 2023, o ciclone Freddy desalojou milhares de pessoas e devastou a agricultura, causando inundações e danos em mais de 4.500 casas. Somado à seca e às más colheitas, mais de um milhão de pessoas enfrentaram insegurança alimentar, reforçando a necessidade de ações ambientais e sociais urgentes.[13] Várias Igrejas do país reagiram à crise com apoio material e espiritual às comunidades afetadas.[14]

Estes desastres naturais afetaram gravemente a moral dos cidadãos malgaxes, que também se preocupam com a poluição, uma vez que a degradação ambiental é responsável por uma em cada cinco mortes. Embora muitos acreditem que o combate à poluição é principalmente responsabilidade dos cidadãos comuns, a grande maioria também apela a maiores esforços governamentais para lidar com o problema de forma eficaz.[15]

Em fevereiro de 2024, o Parlamento de Madagascar aprovou uma lei que permite a castração química e cirúrgica de pessoas consideradas culpadas de violação de menores.[16] No entanto, organizações de direitos humanos como a Amnistia Internacional denunciaram a legislação.[17] A Igreja Católica também se manifestou contra a lei. Num comunicado emitido a 14 de Maio de 2024, os bispos malgaxes condenaram a lei como "tortura" e uma violação dos direitos humanos e dos princípios da Igreja, afirmando que o corpo humano, como criação de Deus, é sagrado e está para além da autoridade da lei. Os bispos questionaram também se esta lei combateria eficazmente a violação. Perante isto, o historiador malgaxe Denis-Alexandre Lahiniriko, observando a influência significativa da Igreja, manifestou dúvidas de que o Governo prosseguisse com as castrações após a denúncia da Igreja.[18]

Em agosto de 2024, aproximadamente 30.000 fiéis reuniram-se em Antsiranana para o terceiro Congresso Eucarístico Nacional de Madagascar, um importante evento espiritual realizado num cenário de pobreza generalizada. A cerimónia de abertura reuniu uma grande assembleia, incluindo todos os bispos católicos do país, e contou com a presença do Presidente Andry Rajoelina e da Primeira Dama Mialy Rajoelina, reflectindo o reconhecimento oficial da importância dos encontros religiosos.[19] Na ocasião, o Papa Francisco enviou uma carta a Dom Marie Fabien Raharilamboniaina, bispo de Morondava, presidente da Conferência Episcopal Católica de Madagascar, incentivando a iniciativa como meio de ajudar os fiéis a redescobrir o significado do culto eucarístico e a aprofundar a sua relação com Cristo. O pontífice reconheceu ainda o crescente sentimento de desânimo e pessimismo entre muitos que sentem que nada lhes pode trazer felicidade. Na ocasião, o Arcebispo de Antsiranana, Benjamin Marc Balthason, salientou a importância da gratidão e do sacrifício como temas centrais do Congresso.[20]

Durante o período deste relatório, não se registraram novos desenvolvimentos relativamente à questão de longa data da inclusão dos muçulmanos em Madagascar, particularmente os de ascendência indiana, paquistanesa e comoriana.[21] Muitos membros da comunidade muçulmana Karana (indo-paquistanesa), que tem profundas raízes históricas em Madagascar, permaneceram apátridas durante gerações, privados de proteção legal e de direitos civis básicos.[22] Desde 1997, apenas alguns pedidos de naturalização, 50 a 100 enviados anualmente, foram aprovados, muitas vezes com atrasos significativos e sem explicação.[23]

Nas regiões do norte de Madagascar, os líderes cristãos continuam a manifestar receios de que as influências fundamentalistas possam estar a enraizar-se, com efeitos potencialmente desestabilizadores. Estas preocupações pareceram confirmadas quando, em Julho de 2024, as forças de segurança malgaxes e costa-marfinenses desmantelaram uma rede do autoproclamado Estado Islâmico que promovia a viagem de jihadistas do Oriente Médio para a Europa. Com a ajuda dos EUA e da França, as autoridades de Madagascar e da Costa do Marfim detiveram oito sírios e iraquianos por fornecerem documentos e vistos falsos. A rede, liderada por três ex-combatentes do autoproclamado Estado Islâmico da mesma família síria, terá sido criada na capital malgaxe, Antananarivo, após a sua libertação de uma prisão no Sudão, dois anos antes.[24] A célula costa-marfinense era suspeita de ter planeado um ataque durante os Jogos Olímpicos de Paris (26 de Julho a 11 de Agosto de 2024).[25]

Perspectivas para a liberdade religiosa

O progresso de Madagascar depende da promoção da unidade, do combate à corrupção generalizada e da capitalização dos seus recursos naturais e culturais. A mensagem de 2024 do Papa Francisco aos católicos malgaxes destacou a necessidade de desenvolvimento espiritual e reconheceu o sentimento predominante de desilusão. Ao mesmo tempo, o desmantelamento de uma rede do autoproclamado Estado Islâmico em 2024, auxiliado pela cooperação internacional, sublinha as preocupações contínuas do país com a segurança. Com esforços nacionais sustentados e colaboração estrangeira, Madagascar tem o potencial de avançar para um futuro mais estável e próspero. Apesar dos obstáculos às perspectivas de naturalização de alguns muçulmanos, as perspectivas para a liberdade religiosa são positivas.

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Notas e Fontes

[1] “Madagascar 2010”, Constitute Project, https://www.constituteproject.org/constitution/Madagascar_2010?lang=en (acessado em 12 de Janeiro de 2025).

[2] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, “Madagascar”, 2023 International Religious Freedom Report, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2023-report-on-international-religious-freedom/madagascar/ (acessado em 12 de Janeiro de 2025).

[3] Ibid.

[4] Ibid.

[5] “Madagascar Reforms Its Nationality Law, Guaranteeing Mothers’ Independent Right to Confer Nationality On Children”, Global Campaign for Equal Nationality Rights, Janeiro de 2017, https://www.equalnationalityrights.org/madagascar-reforms-its-nationality-law-guaranteeing-mothers-independent-right-to-confer-nationality-on-children/ (acessado em 7 de Setembro de 2025).

[6] “Madagascar”, Freedom in the World 2024, Freedom House, https://freedomhouse.org/country/madagascar/freedom-world/2024 (acessado em 30 de Agosto de 2025).

[7] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, “Madagascar”, 2020 International Religious Freedom Report, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2020-report-on-international-religious-freedom/madagascar/ (acessado em 7 de Setembro de 2025).

[8] “Madagascar Country Report 2024”, Bertelsmann Transformation Index (BTI), Bertelsmann Stiftung, https://bti-project.org/en/reports/country-report/MDG (acessado em 30 de Agosto de 2025).

[9] Ibid.

[10] “Madagascar Country Report 2022”, Bertelsmann Transformation Index (BTI)https://bti-project.org/en/downloads?content=country&country=MDG (acessado em 7 de Setembro de 2025).

[11] “Madagascar president re-elected as opposition denounces irregularities”, Al Jazeera, 25 de Novembro de 2023, https://www.aljazeera.com/news/2023/11/25/madagascar-president-re-elected-as-opposition-denounces-irregularities (acessado em 7 de Setembro de 2025).

[12] Ibid.

[13] “Tropical Cyclone Freddy”, ReliefWeb, Fevereiro de 2023, https://reliefweb.int/disaster/tc-2023-000023-mdg (acessado em 12 de Janeiro de 2025).

[14] Stanislas Kambashi, “Madagascar : Lent outreach for storm victims” (em língua francesa), Vatican News, 2 de Março de 2023, https://www.vaticannews.va/fr/afrique/news/2022-03/madagascar-careme-de-solidarite-envers-les-sinistres-de-la-sai.html; “Churches respond as Mozambique and Madagascar face further devastation from Cyclone Freddy”, Anglican Alliance, 2 de Março de 2023, https://anglicanalliance.org/churches-respond-as-mozambique-and-madagascar-face-further-devastation-from-cyclone-freddy/ (acessado em 8 de Setembro de 2025).

[15] Léa Rafzafindrazaka Rakotondraibe e Anne Okello, “Malagasy people consider themselves responsible for the fight against pollution, but also call for greater government efforts” (em língua francesa), Afro Barometer, 20 de Novembro de 2024, https://www.afrobarometer.org/publication/ad903-les-malgaches-se-considerent-responsables-de-la-lutte-contre-la-pollution-mais-appellent-aussi-a-davantage-defforts-gouvernementaux/ (acessado em 12 de Janeiro de 2025).

[16] Sarah Tétaud, “Madagascar law allowing castration of child rapists prompts criticism from rights groups”, AP News, 11 de Fevereiro de 2024, https://apnews.com/article/madagascar-castration-law-andry-rajoelina-rape-criticism-d5efb32b72e48929f95fae1e6d7baefd (acessado em 10 de Janeiro de 2025).

[17] “Madagascar. The authorities must repeal the legalisation of chemical and surgical castration of rapists” (em língua francesa), Amnistia Internacional, 8 de Fevereiro de 2024, https://www.amnesty.org/fr/latest/news/2024/02/madagascar-authorities-must-repeal-the-legalization-of-chemical-and-surgical-castration-of-rapists/ (acessado em 12 de Janeiro de 2025).

[18] Pauline Le Troquier, “Madagascar: Catholic Church slams law allowing the castration of paedophiles” (em língua francesa), Radio France International (RFI), 16 de Maio de 2024, https://www.rfi.fr/fr/afrique/20240516-madagascar-l-%C3%A9glise-catholique-d%C3%A9nonce-la-loi-autorisant-la-castration-des-p%C3%A9dophiles (acessado em 11 de Janeiro de 2025).

[19] Padre Angelo Michel Helpa Randrianarisoa, “‘Gratitude and sacrifice’. 30,000 people in Antsiranana for the third National Eucharistic Congress”, Agenzia Fides, 26 de Agosto de 2024, https://www.fides.org/en/news/75332 (acessado em 30 de Agosto de 2025).

[20] Alexandra Sirgant, “Pope Francis: message for the Eucharistic congress in Madagascar” (em língua francesa), Vatican News, 23 de Agosto de 2024, https://www.vaticannews.va/fr/pape/news/2024-08/pape-francois-message-madagascar-congres-eucharistique-aout-2024.html (acessado em 12 de Janeiro de 2025).

[21] “Madagascar”, Freedom in the World 2024, op. cit.; Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional (2023), op. cit.

[22] Lola Hierro, “Minority Karanas in Madagascar lead clandestine lives with no citizenship”, El País (edição internacional), 8 de Agosto de 2023, https://english.elpais.com/international/2023-08-08/minority-karanas-in-madagascar-lead-clandestine-lives-with-no-citizenship.html (acessado em 30 de Agosto de 2025).

[23] “Madagascar Country Report 2024”, Bertelsmann Transformation Index (BTI), op. cit.

[24] “Malagasy and Ivorian authorities dismantle Islamic State network”, Africa News, 25 de Novembro de 2024, https://www.africanews.com/2024/11/25/malagasy-and-ivorian-authorities-dismantle-islamic-state-network/ (acessado em 12 de Janeiro de 2025).

[25] Benjamin Roger, “An Islamic State network that wanted to reach Europe has been dismantled in Côte d’Ivoire and Madagascar”, Le Monde, 25 de Novembro de 2024, https://www.lemonde.fr/en/international/article/2024/11/25/an-islamic-state-network-that-wanted-to-reach-europe-has-been-dismantled-in-cote-d-ivoire-and-madagascar_6734016_4.html   (acessado em 30 de Agosto de 2025).

ACN (BRASIL). Relatório de Liberdade Religiosa no Mundo. 17° ed. [s. l.]: ACN, 2025. Disponível em: https://www.acn.org.br/relatorio-liberdade-religiosa.