Montenegro
(religiões no país)
clique em cima das cores do gráfico para ver suas porcentagens.
Compartilhar
Disposições legais em relação à liberdade religiosa e aplicação efetiva
Montenegro é uma república secular. O artigo 14.º da Constituição consagra a separação entre as comunidades religiosas e o Estado. Este artigo também garante o direito das comunidades religiosas a "serem iguais e livres no exercício dos ritos religiosos e dos assuntos religiosos".[1]
O artigo 46.º garante o direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião. Este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e de a expressar individual ou coletivamente, de forma pública ou privada, sem qualquer obrigação de revelar as suas convicções.[2] O artigo 25.º estabelece que, mesmo durante um estado de guerra ou de emergência, o direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião não pode ser limitado.[3]
No entanto, o artigo 46.º prevê que o Estado pode limitar temporariamente a “liberdade de expressão de convicções religiosas” em circunstâncias necessárias para “proteger a vida e a saúde das pessoas, a paz e a ordem públicas, bem como outros direitos garantidos pela Constituição”.[4] O artigo 48.º, por sua vez, protege a objeção de consciência para aqueles que, por razões de religião ou convicção, se opõem ao cumprimento de um dever militar ou outro que implique o uso de armas.[5] O artigo 44.º permite igualmente e protege o asilo em Montenegro por motivos de perseguição religiosa no país de origem. O artigo 79.º salvaguarda os direitos das nações e comunidades nacionais minoritárias, garantindo a sua capacidade de praticar as suas tradições religiosas únicas, formar associações religiosas e estabelecer ligações com grupos religiosos fora do país.
Montenegro ratificou o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (PIDCP),[6] e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH).[7]
A divulgação de informações que incitem ao ódio religioso ou à discriminação é constitucionalmente proibida nos termos do artigo 50.º, sendo igualmente proibida a criação e o funcionamento de organizações que tenham por objetivo incitar ao ódio ou à intolerância por motivos religiosos.[8] A difusão ou incitação ao ódio religioso ou à violência é considerada uma infração penal em Montenegro.[9] O Código Penal de Montenegro contém vários artigos que protegem a liberdade religiosa e previnem o ódio religioso de base étnica, incluindo punições severas para o escárnio de símbolos religiosos (artigo 370.º), que, segundo a Humanists International, é uma lei de blasfêmia de fato.[10] O artigo 159.º do Código Penal pune com multa ou prisão a violação dos direitos constitucionais por motivos religiosos,[11] e o artigo 161.º criminaliza a restrição da liberdade de culto, a obstrução de ritos religiosos ou a obrigação de alguém declarar as suas crenças.[12]
A religião em Montenegro é ainda regulamentada pela Lei de 2019 da Liberdade Religiosa ou de Crença e o Estatuto Jurídico das Comunidades Religiosas, que foi alterada em 2021.[13] Esta lei estabelece um quadro jurídico que garante a liberdade de expressão religiosa e os direitos dos grupos religiosos. Ao abrigo desta lei, as organizações religiosas devem registrar-se junto das autoridades para obterem reconhecimento legal; os grupos que existiam antes de 1977 podem registrar-se como uma comunidade existente.[14] A lei também reconhece as dotações “vakuf” (waqf) no seio da comunidade islâmica, como fonte legítima de rendimento para as comunidades religiosas islâmicas e como possível base para reivindicações de propriedade em processos judiciais.[15]
Em 2023, Montenegro tinha reconhecido 23 comunidades religiosas inscritas no Registro Unificado das Comunidades Religiosas.[16] Entre as mais importantes contam-se a Igreja Ortodoxa de Montenegro e a Igreja Ortodoxa Sérvia; a Comunidade Islâmica de Montenegro; a Igreja Católica Romana, que está registrada como dois grupos nas Arquidioceses de Bar e de Kotor; a Comunidade Judaica de Montenegro; e vários grupos protestantes.[17] O governo estabeleceu acordos com a Comunidade Islâmica de Montenegro, a Comunidade Judaica de Montenegro, a Igreja Ortodoxa Sérvia e a Santa Sé, que clarificam o estatuto jurídico destes grupos e a sua relação com o Estado. O acordo com a Santa Sé reconhece especificamente o direito canônico católico como o quadro jurídico da Igreja e especifica os seus direitos de propriedade, enquanto disposições semelhantes se aplicam aos acordos com a Comunidade Islâmica de Montenegro, a Comunidade Judaica de Montenegro e a Igreja Ortodoxa Sérvia.[18]
A tensão histórica entre a Igreja Ortodoxa Sérvia, que é reconhecida como canônica pelas Igrejas Ortodoxas autocéfalas, e a Igreja Ortodoxa de Montenegro, que não tem esse reconhecimento, continua a representar o principal conflito religioso no país.[19] A atual Igreja Ortodoxa de Montenegro foi criada em 1993 e, após a independência de Montenegro em 2006, procurou cada vez mais reivindicar uma autocefalia pré-existente.[20]
Compartilhar
Incidentes e episódios relevantes
O principal incidente que afetou a vida das comunidades religiosas em Montenegro durante o período em análise foi o cisma interno na Igreja Ortodoxa de Montenegro. No início de 2023, o Bispo Boris Bojović iniciou uma campanha para substituir o líder desta Igreja, o Metropolita Miraš Dedeić.[21] No dia 3 de setembro de 2023, o Bispo Bojović organizou a Assembleia Geral de Montenegro em Cetinje, que o declarou o novo Metropolita e tentou excluir o Metropolita Dedeić.[22] O Metropolita Dedeić rejeitou esta medida, classificando-a como uma decisão política e não religiosa. Na sequência disso, o Santo Sínodo da Igreja Ortodoxa de Montenegro destituiu o Bispo Bojović e expulsou-o da Igreja.[23] No final de outubro, o Ministério da Justiça montenegrino recusou o pedido do Bispo Bojović para ser registrado como novo chefe da Igreja Ortodoxa de Montenegro, reafirmando a liderança do Metropolita Dedeić.[24] Durante a celebração da véspera de Natal ortodoxa em 2024 (o Natal ortodoxo é celebrado em janeiro), o conflito entre as duas facções transformou-se em confrontos, exigindo a intervenção da polícia.[25]
As tensões entre Igreja Ortodoxa de Montenegro e a Igreja Ortodoxa Sérvia, particularmente no que respeita a disputas de propriedade, continuaram a persistir durante este período. Com o atual governo de tendência sérvia,[26] as queixas da Igreja Ortodoxa de Montenegro aumentaram, uma vez que se considera numa posição cada vez mais desvantajosa.[27] A Igreja Ortodoxa de Montenegro, que afirma que mais de 750 santuários estão sob o controle da Igreja Ortodoxa Sérvia, acusou o governo de não tomar medidas para resolver os litígios.[28]
Por outro lado, a Igreja Ortodoxa Sérvia alegou que os meios de comunicação social e os ativistas a acusavam injustamente de se imiscuir na política e de estar alinhada com a Sérvia e a Rússia, o que considerava um ataque à liberdade religiosa. No entanto, alguns comentadores sugeriram que a Igreja Ortodoxa Sérvia exerceu pressão sobre o sistema judicial para silenciar as críticas.[29]
Em abril de 2023, vândalos não identificados invadiram a Igreja de São Lucas em Nikšić, danificando o telhado de cobre e roubando vários ícones e objetos sagrados, alguns com quase 150 anos.[30]
Nos últimos dois anos, a Comunidade Islâmica de Montenegro manifestou a sua insatisfação com o governo relativamente à crescente islamofobia e criticou a distribuição injusta do apoio financeiro às comunidades religiosas.[31] A Comunidade Islâmica de Montenegro também denunciou vários casos de retórica antimuçulmana em eventos públicos e cerimônias escolares e criticou a resposta inadequada do governo a estes incidentes.[32] Este sentimento crescente de marginalização foi ainda agravado por certas decisões das autoridades locais, como a decisão da cidade de Pljevlja de mudar o nome do Dia da Libertação para homenagear o feriado ortodoxo de Santa Petka, e por vários incidentes de retórica antimuçulmana envolvendo o presidente da câmara de Nikšić e deputado Marko Kovačević. Em setembro de 2024, a Alta Procuradoria pediu ao Parlamento que levantasse a imunidade de Kovačević devido ao seu contínuo discurso de ódio.[33]
Em outubro de 2024, Rifat Fejzić, chefe da Comunidade Islâmica de Montenegro, sublinhou novamente o aumento alarmante da violência contra os muçulmanos.[34] Fejzić registrou um aumento significativo de ataques por motivos religiosos desde 2023, incluindo ataques contra indivíduos numa praia fluvial, dois atletas bósnios, um proprietário de um clube de fitness e trabalhadores de uma mesquita. Fejzić criticou as autoridades por tratarem estes ataques como incidentes isolados e não como crimes de ódio.
Não foram observados casos relatados de antissemitismo em Montenegro no período em análise, enquanto o Congresso Judaico Mundial reconheceu de forma semelhante na sua página na internet que “não existe antissemitismo no país”.[35]
A Igreja Católica e a Comunidade Islâmica de Montenegro continuaram a defender a criação de leis mais claras sobre a propriedade de bens religiosos e a indenização por bens anteriormente confiscados.[36]
De acordo com a ONG Centro de Educação Cívica, houve falta de transparência na atribuição de fundos governamentais às comunidades religiosas, tendo os fundos sido distribuídos principalmente de forma discricionária, sem a participação do público e sem informações pormenorizadas subsequentes que explicassem a sua base jurídica e os critérios de distribuição.[37]
Perspectivas para a liberdade religiosa
Embora o quadro jurídico de Montenegro proteja, em teoria, a liberdade religiosa, as persistentes tensões étnico-religiosas típicas dos Balcãs também se fazem sentir neste país. Além disso, a aplicação justa das leis é dificultada pela corrupção e pela interferência estrangeira. A Igreja Ortodoxa Sérvia, à qual pertence a maioria dos montenegrinos cristãos, esteve em uma posição desfavorável durante os 20 anos de governo do DPS, mas é agora acusada por outras comunidades religiosas de ter uma posição privilegiada no atual governo. As preocupações manifestadas pela Comunidade Islâmica de Montenegro relativamente à intolerância antimuçulmana são motivo de inquietação, embora não existam dados suficientes para avaliar a sua importância em comparação com os anos anteriores.
Notas e Fontes
[1] “The Constitution of Montenegro, 2007 (rev. 2013)”, Parlamento de Monenegro, https://api.skupstina.me/media/files/1708526717-constitution-of-montenegro.pdf (acessado em 10 de outubro de 2024).
[2] Ibid.
[3] Ibid.
[4] Ibid.
[5] Ibid.
[6] Painel de controle interativo do estatuto de ratificação, Comissão dos Direitos do Homem das Nações Unidas, https://indicators.ohchr.org/ (acessado em 11 de outubro de 2024).
[7] Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, “Montenegro”, Conselho da Europa, https://www.echr.coe.int/documents/d/echr/CP_Montenegro_ENG (acessado em 11 de outubro de 2024).
[8] “The Constitution of Montenegro”, op. cit.
[9] Código Penal de Monenegro, Gabinete das Nações Unidas contra a Droga e o Crime, https://track.unodc.org/uploads/documents/BRI-legal-resources/Montenegro/3_-Criminal_Code_of_Montenegro_2018_English_version.pdf (acessado em 11 de outubro de 2024).
[10] The Freedom of Thought Report 2021, “Montenegro”, Humanists International, https://fot.humanists.international/countries/europe-southern-europe/montenegro/ (acessado em 11 de outubro de 2024).
[11] Código Penal de Monenegro, op. cit.
[12] Ibid.
[13] Закон о слободи вјероисповијести или увјерења и правном положају вјерских заједница , 2019 (rev. 2021), Governo de Monenegro, https://www.gov.me/en/documents/9d0b0752-9efb-4191-969e-2941c699b4c3 (acessado em 11 de outubro de 2024).
[14] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, “Montenegro”, 2023 Report on International Religious Freedom, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2023-report-on-international-religious-freedom/montenegro/ (acessado em 11 de outubro de 2024).
[15] Ibid.
[16] Ibid.
[17] Ibid.
[18] Ibid.
[19] Одлука о уједињењу Српско-православне цркве у Црној Гори са Православном црквом у Србији и осталим српским епископским столицама (Decisão do Santo Sínodo, n.º 1169, 16 de dezembro de 1918), Српска земља Црна Гора, https://www.njegos.org/past/rstanje.htm (acessado em 11 de outubro de 2024).
[20] Srdja Pavlovic, "The politics of worship in Montenegro”, OpenDemocracy, 22 de janeiro de 2020, https://www.opendemocracy.net/en/can-europe-make-it/politics-worship-montenegro/ (acessado em 8 de dezembro de 2024).
[21] “Skandalozan razgovor vladika CPC: ‘Reci mu da mi se ne primiče, e ću ga izgorjet’”, PRESS, 17 de abril de 2023, https://press.co.me/audio-skandalozan-razgovor-vladika-cpc-reci-mu-da-mi-se-ne-primice-e-cu-ga-izgorjet/ (acessado em 11 de outubro de 2024).
[22] “Episkop Boris proglašen za mitropolita CPC”, Cafe del Montenegro, 3 de setembro de 2023, https://www.cdm.me/drustvo/odrzan-opstecrnogorski-zbor-episkop-boris-proglasen-za-mitropolita-cpc/ (acessado em 11 de outubro de 2024).
[23] “Episkop Boris proglašen za mitropolita CPC-a, mitropolit Mihailo osporava izbor”, AJBalkans, 3 de setembro de 2023, https://balkans.aljazeera.net/news/balkan/2023/9/3/episkop-boris-proglasen-za-mitropolita-cpc-a-mitropolit-mihailo-osporava-izbor (acessado em 11 de outubro de 2024).
[24] Сукоб два лажна „митрополита ЦПЦ": суд на Цетињу одлучио”, Политика Online, 10 de outubro de 2023, https://www.politika.rs/scc/clanak/576981/Sukob-dva-lazna-mitropolita-CPC-sud-na-Cetinju-odlucio (acessado em 11 de outubro de 2024).
[25] “Policija spriječila incidente između pristalica Crnogorske pravoslavne crkve na Cetinju”, Radio Slobodna Evropa, 6 de janeiro de 2024, https://www.slobodnaevropa.org/a/crna-gora-cetinje-incident-crkva-nalaganje-badnjaka/32763800.html (acessado em 11 de outubro de 2024).
[26] Depois de o Partido Democrático dos Socialistas (DPS), pró-ocidental, ter governado durante 30 anos, uma coligação da oposição assumiu o poder em 2020. Em 2023, um novo partido da oposição venceu as eleições e tomou posse. Ver "Montenegro appoints predominantly pro-EU new government”, Reuters, 31 de outubro de 2023, https://www.reuters.com/world/europe/montenegro-votes-new-government-with-milojko-spajic-prime-minister-2023-10-31/ (acessado em 8 de dezembro de 2024).
[27] “Montenegrin analyst Filipović: Russia, through Serbia, is using the Orthodox Church to deepen tensions in Montenegro”, Telegrafi, 2022, https://telegrafi.com/en/Montenegrin-analyst-Filipovic%2C-Russia-through-Serbia-is-using-the-Orthodox-Church-to-deepen-tensions-in-Montenegro/ (acessado em 11 de outubro de 2024).
[28] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, op. cit.
[29] Ibid.
[30] “Vandalizam: Oskrnavili crkvu u nikšićkom naselju, odnijeli 23 ikone”, CRNA Hronika, 8 de abril de 2023, https://crna-hronika.info/vandalizam-oskrnavili-crkvu-u-niksickom-naselju-odnijeli-23-ikone/489523 (acessado em 6 de dezembro de 2024).
[31] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, op. cit.
[32] “Stejt Department: Islamska zajednica u Crnoj Gori suočena s diskriminacijom i antimuslimanskom retorikom”, Radio Fatih, sem data, https://radiofatih.me/vijesti/stejt-department-islamska-zajednica-u-crnoj-gori-suocena-s-diskriminacijom-i-antimuslimanskom-retorikom/ (acessado em 11 de outubro de 2024).
[33] “High Prosecutor’s Office seeks lifting Marko Kovacevic’s immunity”, Cafe del Montenegro, 27 de outubro de 2024, https://www.cdm.me/english/high-prosecutors-office-seeks-lifting-marko-kovacevics-immunity/ (acessado em 11 de outubro de 2024).
[34] Rifat Fejzić, “Svjedočimo porastu nasilja prema muslimanima”, Radio-Televizija Nikšić, 9 de outubro de 2024, https://rtnk.me/drustvo/rifat-fejzic-svjedocimo-porastu-nasilja-prema-muslimanima/ (acessado em 11 de outubro de 2024).
[35] Montenegro, World Jewish Congress, https://www.worldjewishcongress.org/en/about/communities/ME (acessado em 7 de novembro de 2024).
[36] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, op. cit.
[37] “Vjerskim zajednicima za tri godine isplaćeno preko 3,7 miliona EUR”, MINA - Montenegro Independent News Agency, 27 de março de 2024, https://mina.news/vijesti-iz-crne-gore/drustvo/vjerskim-zajednicima-za-tri-godine-isplaceno-preko-37-miliona-eur/ (acessado em 11 de outubro de 2024).
![Religious Freedom Report [MAP] ( 2025 ) Religious Freedom Report [MAP] ( 2025 ) Placeholder](https://www.acn.org.br/wp-content/plugins/interactive-world-maps/imgs/placeholder.png)





