Guiné
(religiões no país)

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Disposições legais em relação à liberdade religiosa e aplicação efetiva

A Guiné não tem atualmente uma Constituição completa. No dia 5 de setembro de 2021,[1] soldados guineenses derrubaram o presidente Alpha Condé num golpe de Estado liderado pelo Tenente-Coronel Mamady Doumbouya,[2] posteriormente promovido a general.[3] Foi criado um Comitê Nacional para a Reconciliação e Desenvolvimento (CNRD), autoproclamado, em substituição do governo civil.

O golpe de Estado segue-se a uma década de governo democrático. Após mais de 50 anos de governo autocrático sob os presidentes Sekou Touré (1958-84) e Lansana Conté (1984-2008) e vários regimes transitórios de curta duração, a Guiné realizou as suas primeiras eleições presidenciais largamente livres em 2010. Alpha Condé tornou-se o primeiro presidente democraticamente eleito da República da Guiné. No entanto, em 2019 e 2020, ele impôs alterações à Constituição de 2010[4] e aprovou um referendo em março de 2020[5] que lhe permitia candidatar-se a um terceiro mandato como presidente. Foi reeleito em outubro de 2020,[6] mas a oposição rejeitou os resultados tanto do referendo como das eleições.

Ao derrubar o Presidente Condé, a nova junta militar dissolveu também o Parlamento do país e suspendeu a Constituição, substituindo esta última a 27 de setembro de 2021 por uma Carta de Transição Guineense (Charte de la transition guinéenne).[7]

A Carta reitera alguns dos princípios da Constituição suspensa. A "Guiné", afirma, é uma "república unitária, indivisível, soberana, secular, social e democrática" (artigo 3.º). Qualquer pessoa que ameace a "forma republicana do Estado, a sua natureza secular, soberania, independência e unidade nacional" é culpada de alta traição (artigo 7.º). Qualquer cidadão pode exercer as suas "liberdades e direitos fundamentais" em conformidade com a lei (artigo 8.º). A Carta afirma que será punido quem "ameace a unidade nacional, a segurança do Estado, a integridade territorial da República ou o bom funcionamento das instituições democráticas" com atos de "discriminação racial, étnica, religiosa ou propaganda regionalista ou comunitária" (artigo 15.º). Além disso, a Carta cria um Conselho Nacional de Transição (CNT) de 81 membros, que inclui dois representantes de "confissões religiosas" (artigo 60.º).[8]

Os muçulmanos são a maioria da população, principalmente os sunitas de Maliki, e as comunidades cristãs estão localizadas particularmente nas grandes cidades, bem como nas regiões do sul e leste. Muitos guineenses ainda praticam as crenças religiosas tradicionais. O país acolhe igualmente pequenos grupos de bahá'ís, hindus e budistas. A coexistência religiosa é tradicionalmente pacífica na Guiné.[9]

As comunidades religiosas devem registrar-se no Secretariado Geral dos Assuntos Religiosos (SRA), uma agência governamental, e apresentar semestralmente um relatório sobre as suas atividades. Os grupos registrados têm isenções fiscais e recebem subsídios de energia. Alguns grupos (Testemunhas de Jeová e Bahá'ís) optaram por não se registrar para evitar o controle do SRA.[10]

Os grupos registrados devem seguir as orientações do SRA para os sermões semanais de sexta-feira nas mesquitas e para os sermões dominicais nas igrejas. Isto é feito para assegurar que o seu conteúdo não é nem radical nem político. Para tal, os inspetores monitorizam as mesquitas e igrejas para ver se as suas mensagens seguem as diretivas do SRA. Os clérigos desobedientes podem ser sujeitos a ações disciplinares, mas isto é difícil de implementar uma vez que a agência carece de financiamento e outros recursos.[11]

A religião não é ensinada nas escolas primárias estatais. Em vez disso, muitos pais optam por enviar os seus filhos para escolas islâmicas que, para além do currículo estatal obrigatório, oferecem estudos do Corão. Em geral, estas escolas islâmicas são o primeiro local para o ensino religioso tradicional e algumas recebem financiamento dos governos locais.

Alternativamente, alguns pais enviam os seus filhos para madraças ou escolas corânicas que não seguem o currículo estatal, embora a maioria destas crianças, a tempo parcial, também frequente escolas públicas ou privadas que oferecem o currículo. Uma vez que não são reconhecidas pelo governo, estas madraças podem funcionar como entenderem, ensinando em árabe em vez de francês, com financiamento da Arábia Saudita e dos estados do Golfo.[12]

As escolas cristãs privadas estão presentes na capital e nas grandes cidades, abertas a alunos cristãos e não cristãos. Embora sigam o currículo estatal obrigatório, não recebem qualquer apoio governamental.[13]

Os grupos religiosos não estão autorizados a possuir as suas próprias estações de rádio ou televisão, mas as autoridades permitem a difusão de programas religiosos em rádios comerciais privadas, incentivando a igualdade de tempo de emissão entre cristãos e muçulmanos.[14]

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Incidentes e episódios relevantes

No dia 29 de junho de 2023, o Papa Francisco instituiu a Diocese de Guéckédou como a quinta Sé Episcopal da Guiné, nomeando Monsenhor Norbert Tamba Sandouno como seu primeiro bispo.[15] A nova diocese, que é sufragânea da Arquidiocese de Conacri, faz fronteira com as dioceses de Kankan a norte, Kenema (Serra Leoa) a oeste, Gbarnga (Libéria) a sul e N'Zérékoré a leste.[16]

Em fevereiro de 2024 foi criada a Diocese de Boké, sendo D. Moïse Tinguiano o seu primeiro bispo. A criação destas duas jurisdições episcopais marca a primeira vez que uma nova diocese é criada no país desde a sua independência.[17]

Em julho de 2024 foi apresentado um anteprojeto da nova Constituição da Guiné, propondo um parlamento bicameral, candidatos presidenciais independentes e um limite de dois mandatos para a presidência. Estabelece igualmente uma idade de elegibilidade para os candidatos presidenciais, dando azo a especulações sobre o antigo Presidente Alpha Condé, que não se encontra dentro dos limites de idade. O projeto poderá demorar algum tempo a ser concluído, com discussões em curso sobre as desqualificações políticas e leis adicionais. Este projeto surge quase três anos após o golpe de Estado do General Mamady Doumbouya e a sua promessa de um período de transição de dois anos.[18]

No meio da agitação política pós-golpe, o arcebispo de Conacri, Vincent Coulibaly, dirigiu-se ao Conselho Nacional de Transição[19] salientando a necessidade de proteger as liberdades religiosas na nova Constituição da Guiné. Apelou a uma Constituição que defenda o secularismo, respeitando simultaneamente os direitos religiosos, e propôs uma estrutura governamental com um presidente e um primeiro-ministro, bem como um parlamento bicameral. Apelou igualmente a reformas judiciais, a eleições regionais e a medidas anticorrupção para restaurar a confiança no governo e nas forças de segurança. Além disso, recomendou a realização de eleições municipais e legislativas antes da votação presidencial.[20]

Em um decreto transmitido pela televisão nacional em setembro de 2024, o Presidente Mamady Doumbouya nomeou dois antigos ministros para cargos na Presidência da República.[21]

No dia 2 de setembro de 2024, a Junta da Guiné suspendeu as licenças das associações e ONG durante quatro meses, invocando perturbações da ordem pública por parte de certos grupos. O General Ibrahima Kalil Condé, ministro da Administração Territorial, declarou que as renovações dependeriam da avaliação que o governo fizesse das atividades de cada organização. Não ficou claro se as licenças existentes permaneceriam válidas durante a suspensão.[22]

 

Perspectivas para a liberdade religiosa

No período em análise, não foram comunicados incidentes significativos que afetassem a liberdade religiosa ou atos de violência por motivos religiosos. Em geral, a liberdade religiosa é protegida.

No entanto, nos últimos anos, a Guiné tem sido afetada pela instabilidade política. Felizmente, até à data, o país conseguiu evitar o extremismo religioso e o jihadismo, graças, em parte, à sua longa tradição de coexistência pacífica entre religiões. Não é claro se esta situação se manterá no futuro. No entanto, as perspectivas atuais para a liberdade religiosa continuam positivas.

 

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Notas e Fontes

[1] “Who is Alpha Conde, Guinea’s toppled president?”, Al Jazeera, 6 de setembro de 2021, https://www.aljazeera.com/news/2021/9/6/toppled-alpha-conde-failed-to-live-up-to-his-promises-in-guinea (acessado em 15 de novembro de 2024).

[2] “Guinea coup: Who is Col Mamady Doumbouya?”, BBC News, 1 de outubro de 2021, https://www.bbc.com/news/world-africa-58461971 (acessado em 15 de novembro de 2024).

[3] "Guinea Leader Doumbouya Promoted from Colonel to General”, Voice of America-Africa, 24 de janeiro de 2024, https://www.voaafrica.com/a/guinea-leader-doumbouya-promoted-from-colonel-to-general/7455059.html (acessado em 13 de janeiro de 2025).

[4] Guinea 2010, Constitute Project, https://www.constituteproject.org/constitution/Guinea_2010?lang=en (acessado em 15 de novembro de 2024).

[5] “Guinea referendum backs constitutional changes that may extend president's rule”, Reuters, 27 de março de 2020, https://www.reuters.com/article/us-guinea-election-idUSKBN21E39O (acessado em 15 de novembro de 2024).

[6] “Guinea President Alpha Condé wins controversial third term”, France 24, 24 de outubro de 2020, https://www.france24.com/en/africa/20201024-guinea-president-alpha-cond%C3%A9-wins-re-election-with-59-5-of-vote (acessado em 15 de novembro de 2024).

[7] “Guinée : Voici la charte de la transition (document complet)”, ConakryInfos, 28 de setembro de 2021, https://conakryinfos.com/guinee-voici-la-charte-de-la-transition-document-complet/ (acessado em 15 de novembro de 2024).

[8] Ibid.

[9] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, “Guinea”, 2023 International Religious Freedom Report, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2021-report-on-international-religious-freedom/guinea/ (acessado em 15 de novembro de 2024).

[10] Ibid.

[11] Ibid.

[12] Ibid.

[13] Ibid.

[14] Ibid.

[15] Silas Isenjia, “Le pape François érige un nouveau diocèse catholique en Guinée et nomme son premier évêque”, ACI Afrique, 29 de junho de 2023, https://www.aciafrique.org/news/8180/le-pape-francois-erige-un-nouveau-diocese-catholique-en-guinee-et-nomme-son-premier-eveque(acessado em 15 de novembro de 2024).

[16] “Guinée: érection du diocèse de Guéckédou et nomination du premier évêque”, Vatican News, 29 de junho de 2023, https://www.vaticannews.va/fr/afrique/news/2023-06/guinee-erection-du-diocese-de-gueckedou-et-nomination-du-premie.html (acessado em 19 de janeiro de 2025).

[17] “Holy See Press Office Bulletin, 22 February 2024”, Gabinete de Imprensa do Vaticano, 22 de fevereiro de 2024, https://press.vatican.va/content/salastampa/en/bollettino/pubblico/2024/02/22/240222a.html (acessado em 19 de janeiro de 2025).

[18] Damien Glez, “Avant-projet de constitution en Guinée : « Non » aux binationaux, « oui » aux militaires”, Jeune Afrique, 7 de agosto de 2024, https://www.jeuneafrique.com/1596502/politique/avant-projet-de-constitution-en-guinee-non-aux-binationaux-oui-aux-militaires/ (acessado em 15 de novembro de 2024).

[19] “La junte guinéenne dévoile la composition du Conseil national de transition”, Voice of America, 23 de janeiro de 2022, https://www.voaafrique.com/a/le-conseil-national-de-transition-de-guin%C3%A9e-enfin-d%C3%A9voil%C3%A9/6408674.html (acessado em 19 de janeiro de 2025).

[20] Jude Atemanke, “Selon un archevêque catholique, la nouvelle constitution de la Guinée doit préserver les libertés religieuses”, ACI Afrique, 2 de junho de 2023,  https://www.aciafrique.org/news/7995/selon-un-archeveque-catholique-la-nouvelle-constitution-de-la-guinee-doit-preserver-les-libertes-religieuses (acessado em 15 de novembro de 2024).

[21] Abdoul Malicj Diallo, “Décret : Deux anciens ministres nommés conseillers à la présidence", Guinée360, 12 de setembro de 2024, https://www.guinee360.com/12/09/2024/decret-deux-anciens-ministres-nommes-conseillers-a-la-presidence/ (acessado em 15 de novembro de 2024).

[22] “En Guinée, la junte suspend la délivrance des agréments aux ONG et associations”, Le Monde, 2 de setembro de 2024,  https://www.lemonde.fr/afrique/article/2024/09/02/en-guinee-la-junte-suspend-la-delivrance-des-agrements-aux-ong-et-associations_6302417_3212.html (acessado em 15 de novembro de 2024).

ACN (BRASIL). Relatório de Liberdade Religiosa no Mundo. 17° ed. [s. l.]: ACN, 2025. Disponível em: https://www.acn.org.br/relatorio-liberdade-religiosa.