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Guerra em Moçambique: “Os que sofrem mais são os mais pobres.”

28 de novembro de 2020

Na província de Cabo Delgado, Moçambique, as crianças pararam de ir para a escola e as famílias pararam de produzir e plantar suas roças. O motivo não foi a Covid-19, foi um inimigo muito mais desumano: uma guerra que se estende desde 2017.

“Nós estamos vivendo aqui um momento de guerra que já dura três anos. Começou com um ataque a um posto policial, depois às aldeias distantes, passando pelas aldeias maiores até chegar ao centro das cidades. Quatro cidades já foram praticamente esvaziadas. Essa guerra já fez mais de dois mil mortos e temos agora mais de 500 mil deslocados.” Assim inicia a entrevista de Dom Luiz Fernando Lisboa à ACN. O brasileiro é hoje bispo da Diocese de Pemba, onde ocorrem os ataques de um grupo terrorista.

Minutos antes da entrevista, Dom Luiz recebeu mais uma triste notícia de Nangololo, onde estava a Missão do Sagrado Coração de Jesus: “A segunda missão mais importante da Diocese foi totalmente destruída, a Igreja, a casa dos padres, a casa das irmãs, a rádio comunitária, o ambulatório. Totalmente destruído. O povo já tinha fugido da missão pelas matas, para outras cidades e aqui para Pemba. Nós ajudamos muita gente, enviamos dinheiro para que pudessem vir para lugares mais seguros.”

Meio milhão de deslocados por causa da guerra em Moçambique

Ajudar os outros tornou-se a prioridade de Dom Luiz Fernando nos últimos anos: “Mais de meio milhão de pessoas deslocadas precisam de tudo! De alimento, roupa, medicamentos, panelas, precisam de atenção, de um lugar para morar, de tudo. É uma guerra que tem trazido muito sofrimento a todos nós”. A Igreja está muito presente na região desde o início do conflito, denunciando e ajudando. “A igreja tem emprestado a sua voz para ser a voz dos pobres, dos sem vez, daqueles que não têm essa oportunidade, de estar de frente a uma câmera, como eu estou agora, e de poder falar. Esse é o primeiro trabalho: falar, mostrar a realidade. A igreja tem trabalhado através da Cáritas, que é seu braço humanitário, para responder a essa emergência que nós temos vivido”.

Pedir a paz, o trabalho da Igreja

O Bispo de Pemba tornou-se a principal voz a denunciar o que acontece em Cabo Delgado: “A Igreja é comprometida com a verdade, porque nós seguimos Jesus, que disse: ‘Eu sou o caminho, a verdade e a vida’. Todos os missionários estão juntos. Estamos todos trabalhando em função de minimizar essa crise humanitária, de ir ao encontro dos mais vulneráveis, de tentar fazer alguma coisa para diminuir o sofrimento. Nós não temos medo porque nós estamos falando a verdade. Aquilo que temos falado é o que o Papa Francisco fala tantas vezes todos os dias: nós queremos resgatar a dignidade das pessoas, queremos justiça social, queremos que as pessoas tenham os seus direitos respeitados, queremos que as pessoas vivam em paz. Isso não é pedir demais. Está nas constituições de todos os países, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, na própria Bíblia e no Alcorão.”

Dom Luiz que o pedido que eles têm a fazer é um só: “O que nós, religiosos, pedimos, é que haja paz. Será que é muito pedir paz? É esse o trabalho da igreja. Enquanto rezamos, também trabalhamos, vamos ao encontro das pessoas, somos ativistas para que a paz venha. A paz é uma construção e é importante envolver as pessoas, não só o povo de Moçambique, mas a comunidade internacional. Por trás de toda guerra existem os responsáveis. Em qualquer guerra não há vencedores. Todos perdemos. Há pessoas que lucram, pensam que vencem, mas também são perdedores.”

“Não é uma guerra contra os cristãos”

Sobre os motivos do conflito, o Bispo de Pemba se preocupa em esclarecer que não é uma guerra contra os cristãos: “Os cristãos não são o principal alvo dos terroristas. Já foram queimadas muitas igrejas cristãs importantes como essa que eu citei, a missão de Nangololo. A igreja histórica de Mocímboa da Praia foi toda queimada e muitas capelas rurais. Mas também foram queimadas mesquitas. Assim como foram mortos catequistas, animadores de comunidades; assim como foram presas duas religiosas; também foi morto um chefe muçulmano e outras lideranças. Então, não é uma guerra contra os cristãos. Entre os líderes religiosos aqui em Cabo Delgado, em Moçambique, nós temos um bom relacionamento e nunca houve problema entre nós.”

Dom Luiz lembra que “os próprios muçulmanos se distanciam dessa guerra e não aceitam que tentem atribuir uma guerra por motivos religiosos. Eles dizem que estão usando a capa da religião para esconder outros interesses que são sobretudo interesses econômicos.” De fato, de acordo com o bispo, a região é rica em recursos naturais, como gás, pedras preciosas, grafite e ouro.

A maior preocupação do bispo é que “esse terrorismo tem feito sofrer a nossa população, tem adiado os sonhos de muita gente. Anualmente já sofríamos de fome em certa época do ano. De três anos pra cá muita gente não está produzindo. Então a fome será ainda maior. A guerra só tem perdedor, mas os que sofrem mais são os mais pobres.”

A ACN ajuda o povo de Moçambique

É para ajudar os que mais sofrem que a ACN também se mobiliza para socorrer e dar voz às vítimas desse conflito em Cabo Delgado. A ACN também está ajudando concretamente por meio de diversos projetos de ajuda emergencial. No dia 25 de novembro, na RedWednesday, a ACN iluminou o Cristo Redentor em vermelho para também lembrar as vítimas dos ataques em Moçambique e alimentar a esperança da população.

“O que o povo moçambicano mais quer é paz. Moçambique já enfrentou duas guerras e, aqui em Cabo Delgado, estamos enfrentando a terceira. O povo está cansado, está sofrendo muito com essa guerra. O povo de Cabo Delgado, de Moçambique quer paz, anseia pela paz. Nós agradecemos essa solidariedade mundial com a nossa situação aqui e iluminar hoje o Cristo Redentor para lembrar todos os nossos mortos, não só os cristãos, mas todos os mortos, dessa guerra e de outras guerras, ajuda-nos a combater a indiferença que muitas vezes está em nós. Nós não podemos ser indiferentes ao sofrimento, à dor, à morte de tantos irmãos e irmãs nossos”, lembra o bispo de Pemba.

Mensagem aos benfeitores da ACN

Para os benfeitores da ACN, Dom Luiz envia sua mensagem de gratidão por toda a colaboração: “Eu agradeço do fundo do coração a todos os benfeitores e benfeitoras da ACN. Nós, como Diocese de Pemba, mesmo antes da guerra, antes do ciclone Kenneth, temos sido ajudados pela ACN. Já nos ajudaram no apoio à formação de seminaristas, no apoio à espiritualidade e formação de padres e irmãs, já nos ajudaram com carros para os nossos missionários. Neste momento da emergência, por causa da guerra, já aprovaram projetos de ajuda emergencial. Então, o meu muito obrigado. Que Deus abençoe profundamente cada pessoa que colabora com essa verdadeira obra missionária. Muito obrigado, que Deus lhes abençoe.

Para que a ACN possa continuar ajudando as vítimas dessa terrível situação de guerra em Moçambique, precisamos da sua doação!

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Na província de Cabo Delgado, Moçambique, as crianças pararam de ir para a escola e as famílias pararam de produzir e plantar suas roças. O motivo não foi a Covid-19, foi um inimigo muito mais desumano: uma guerra que se estende desde 2017.

“Nós estamos vivendo aqui um momento de guerra que já dura três anos. Começou com um ataque a um posto policial, depois às aldeias distantes, passando pelas aldeias maiores até chegar ao centro das cidades. Quatro cidades já foram praticamente esvaziadas. Essa guerra já fez mais de dois mil mortos e temos agora mais de 500 mil deslocados.” Assim inicia a entrevista de Dom Luiz Fernando Lisboa à ACN. O brasileiro é hoje bispo da Diocese de Pemba, onde ocorrem os ataques de um grupo terrorista.

Minutos antes da entrevista, Dom Luiz recebeu mais uma triste notícia de Nangololo, onde estava a Missão do Sagrado Coração de Jesus: “A segunda missão mais importante da Diocese foi totalmente destruída, a Igreja, a casa dos padres, a casa das irmãs, a rádio comunitária, o ambulatório. Totalmente destruído. O povo já tinha fugido da missão pelas matas, para outras cidades e aqui para Pemba. Nós ajudamos muita gente, enviamos dinheiro para que pudessem vir para lugares mais seguros.”

Meio milhão de deslocados por causa da guerra em Moçambique

Ajudar os outros tornou-se a prioridade de Dom Luiz Fernando nos últimos anos: “Mais de meio milhão de pessoas deslocadas precisam de tudo! De alimento, roupa, medicamentos, panelas, precisam de atenção, de um lugar para morar, de tudo. É uma guerra que tem trazido muito sofrimento a todos nós”. A Igreja está muito presente na região desde o início do conflito, denunciando e ajudando. “A igreja tem emprestado a sua voz para ser a voz dos pobres, dos sem vez, daqueles que não têm essa oportunidade, de estar de frente a uma câmera, como eu estou agora, e de poder falar. Esse é o primeiro trabalho: falar, mostrar a realidade. A igreja tem trabalhado através da Cáritas, que é seu braço humanitário, para responder a essa emergência que nós temos vivido”.

Pedir a paz, o trabalho da Igreja

O Bispo de Pemba tornou-se a principal voz a denunciar o que acontece em Cabo Delgado: “A Igreja é comprometida com a verdade, porque nós seguimos Jesus, que disse: ‘Eu sou o caminho, a verdade e a vida’. Todos os missionários estão juntos. Estamos todos trabalhando em função de minimizar essa crise humanitária, de ir ao encontro dos mais vulneráveis, de tentar fazer alguma coisa para diminuir o sofrimento. Nós não temos medo porque nós estamos falando a verdade. Aquilo que temos falado é o que o Papa Francisco fala tantas vezes todos os dias: nós queremos resgatar a dignidade das pessoas, queremos justiça social, queremos que as pessoas tenham os seus direitos respeitados, queremos que as pessoas vivam em paz. Isso não é pedir demais. Está nas constituições de todos os países, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, na própria Bíblia e no Alcorão.”

Dom Luiz que o pedido que eles têm a fazer é um só: “O que nós, religiosos, pedimos, é que haja paz. Será que é muito pedir paz? É esse o trabalho da igreja. Enquanto rezamos, também trabalhamos, vamos ao encontro das pessoas, somos ativistas para que a paz venha. A paz é uma construção e é importante envolver as pessoas, não só o povo de Moçambique, mas a comunidade internacional. Por trás de toda guerra existem os responsáveis. Em qualquer guerra não há vencedores. Todos perdemos. Há pessoas que lucram, pensam que vencem, mas também são perdedores.”

“Não é uma guerra contra os cristãos”

Sobre os motivos do conflito, o Bispo de Pemba se preocupa em esclarecer que não é uma guerra contra os cristãos: “Os cristãos não são o principal alvo dos terroristas. Já foram queimadas muitas igrejas cristãs importantes como essa que eu citei, a missão de Nangololo. A igreja histórica de Mocímboa da Praia foi toda queimada e muitas capelas rurais. Mas também foram queimadas mesquitas. Assim como foram mortos catequistas, animadores de comunidades; assim como foram presas duas religiosas; também foi morto um chefe muçulmano e outras lideranças. Então, não é uma guerra contra os cristãos. Entre os líderes religiosos aqui em Cabo Delgado, em Moçambique, nós temos um bom relacionamento e nunca houve problema entre nós.”

Dom Luiz lembra que “os próprios muçulmanos se distanciam dessa guerra e não aceitam que tentem atribuir uma guerra por motivos religiosos. Eles dizem que estão usando a capa da religião para esconder outros interesses que são sobretudo interesses econômicos.” De fato, de acordo com o bispo, a região é rica em recursos naturais, como gás, pedras preciosas, grafite e ouro.

A maior preocupação do bispo é que “esse terrorismo tem feito sofrer a nossa população, tem adiado os sonhos de muita gente. Anualmente já sofríamos de fome em certa época do ano. De três anos pra cá muita gente não está produzindo. Então a fome será ainda maior. A guerra só tem perdedor, mas os que sofrem mais são os mais pobres.”

A ACN ajuda o povo de Moçambique

É para ajudar os que mais sofrem que a ACN também se mobiliza para socorrer e dar voz às vítimas desse conflito em Cabo Delgado. A ACN também está ajudando concretamente por meio de diversos projetos de ajuda emergencial. No dia 25 de novembro, na RedWednesday, a ACN iluminou o Cristo Redentor em vermelho para também lembrar as vítimas dos ataques em Moçambique e alimentar a esperança da população.

“O que o povo moçambicano mais quer é paz. Moçambique já enfrentou duas guerras e, aqui em Cabo Delgado, estamos enfrentando a terceira. O povo está cansado, está sofrendo muito com essa guerra. O povo de Cabo Delgado, de Moçambique quer paz, anseia pela paz. Nós agradecemos essa solidariedade mundial com a nossa situação aqui e iluminar hoje o Cristo Redentor para lembrar todos os nossos mortos, não só os cristãos, mas todos os mortos, dessa guerra e de outras guerras, ajuda-nos a combater a indiferença que muitas vezes está em nós. Nós não podemos ser indiferentes ao sofrimento, à dor, à morte de tantos irmãos e irmãs nossos”, lembra o bispo de Pemba.

Mensagem aos benfeitores da ACN

Para os benfeitores da ACN, Dom Luiz envia sua mensagem de gratidão por toda a colaboração: “Eu agradeço do fundo do coração a todos os benfeitores e benfeitoras da ACN. Nós, como Diocese de Pemba, mesmo antes da guerra, antes do ciclone Kenneth, temos sido ajudados pela ACN. Já nos ajudaram no apoio à formação de seminaristas, no apoio à espiritualidade e formação de padres e irmãs, já nos ajudaram com carros para os nossos missionários. Neste momento da emergência, por causa da guerra, já aprovaram projetos de ajuda emergencial. Então, o meu muito obrigado. Que Deus abençoe profundamente cada pessoa que colabora com essa verdadeira obra missionária. Muito obrigado, que Deus lhes abençoe.

Para que a ACN possa continuar ajudando as vítimas dessa terrível situação de guerra em Moçambique, precisamos da sua doação!

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