Bulgária
(religiões no país)
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Disposições legais em relação à liberdade religiosa e aplicação efetiva
A Constituição da Bulgária de 1991 (revista em 2015)[1] garante a liberdade de religião e de crença. O artigo 13.º (n.º 1-4) amplia a proteção a todas as religiões, assegura a separação das instituições religiosas do Estado, reconhece o Cristianismo ortodoxo oriental como a “religião tradicional” do país e proíbe a utilização da religião para fins políticos. O artigo 37.º (n.º 1 e 2) garante ainda a liberdade de consciência, a liberdade de pensamento e a escolha da religião ou de visões ateístas. Estabelece que o Estado deve “ajudar a manter a tolerância e o respeito entre os fiéis de diferentes denominações e entre crentes e não crentes”. No entanto, a liberdade de consciência e de religião não deve ser praticada “em detrimento da segurança nacional, da ordem pública, da saúde e da moral públicas, ou dos direitos e liberdades de outrem”.
A principal lei que regula a liberdade de religião ou crença é a Lei das Denominações Religiosas (2002), que estabelece protocolos para o reconhecimento legal das denominações e comunidades religiosas. Todos os grupos religiosos podem praticar legalmente o seu culto sem se registrarem, mas os grupos registrados recebem alguns benefícios. A Igreja Ortodoxa Búlgara está isenta de registro devido ao seu estatuto de Igreja tradicional da Bulgária.[2] Em setembro de 2024 existiam 237 grupos religiosos registrados.[3]
Nos últimos anos, a influência da retórica antirreligiosa de alguns partidos políticos e meios de comunicação diminuiu, em parte devido às mudanças sociais que tendem para um maior pluralismo e tolerância.[4] O fato de a Bulgária ter sido objeto de várias sentenças desfavoráveis do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) por violação da liberdade religiosa é também provavelmente um fator de melhoria.[5]
Em 2018, o Parlamento búlgaro introduziu várias limitações à liberdade religiosa, incluindo a exigência de os pregadores estrangeiros informarem a Direção das Denominações antes de realizarem um culto. Existem também restrições relacionadas com o funcionamento de escolas por grupos religiosos.[6] As escolas confessionais anteriormente reconhecidas tiveram de ser novamente registradas segundo regras mais rigorosas, o que levou a que algumas perdessem o seu estatuto. Uma iniciativa legislativa no final de 2024 levou a alterações à lei das religiões que limitaram ainda mais a liberdade através da interferência do Estado em questões eclesiásticas. As alterações adotadas significam que o Estado reconhece a Igreja Ortodoxa Búlgara como sendo a única Igreja Ortodoxa do país.[8] Qualquer outra Igreja que pretenda registrar-se como Igreja Ortodoxa está agora proibida de o fazer. Todas as Igrejas já registradas com o termo "Ortodoxa" no seu nome serão canceladas após um período de dois meses.[9]
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Incidentes e episódios relevantes
No entanto, em dezembro de 2024, o Supremo Tribunal de Cassação da Bulgária decidiu que uma Igreja Ortodoxa alternativa poderia ser registrada pelo Tribunal da Cidade de Sófia. Os tribunais tinham anteriormente recusado o registro à Igreja Ortodoxa Búlgara do Calendário Antigo[10] argumentando que isso comprometeria o estatuto único da Igreja Ortodoxa Búlgara de fato.[11] O Governo argumentou que, mesmo sem registro, a Igreja Ortodoxa Búlgara do Calendário Antigo podia operar cerca de 35 igrejas no país sem qualquer impedimento.[12] A Bulgária já tinha sido considerada em violação da Convenção Europeia dos Direitos do Homem em 2021 por se ter recusado a registrar a Igreja Ortodoxa Búlgara do Calendário Antigo.[13]
Apesar das decisões do TEDH e do TPI, a Agência de Registro continua a recusar o registro desta Igreja.[14] O Parlamento procurou alterar a Lei das Denominações Religiosas para se sobrepor à decisão do tribunal de 16 de dezembro de 2024[15] de ordenar o registro da Igreja Ortodoxa Búlgara do Calendário Antigo.[16] No entanto, o Comitê de Ministros do Conselho da Europa insiste em que a Bulgária cumpra as decisões do TEDH em matéria de liberdade religiosa.[17] O Governo búlgaro tem um histórico de interferência em disputas denominacionais internas, principalmente com a Igreja Ortodoxa[18] e a Comunidade Muçulmana.[19] Apesar de uma série de pareceres jurídicos de peritos apresentados ao Parlamento contra as alterações propostas, apontando para graves violações da Constituição e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, o projeto de lei foi aprovado no início de 2025.
A organização judaica Shalom queixou-se repetidamente do aumento do antissemitismo em 2023 e 2024.[20]
Em dezembro de 2023 foi recusado à igreja da Nova Criação, na cidade de Karlovo, o acesso aos terrenos municipais para um evento religioso relacionado com a celebração do Natal. A mesma igreja não foi autorizada a realizar um bazar festivo em dezembro de 2024.[21]
O Instituto Teológico Evangélico Búlgaro informou que as alterações restritivas à Lei das Denominações Religiosas, que entraram em vigor em 2019, o impediram de obter a acreditação governamental necessária como instituto de ensino superior.[22]
No dia 13 de março de 2023, a sentença do TEDH no processo “Tonchev e outros contra a Bulgária”[23] foi concluída.[24] O caso envolvia três representantes de igrejas evangélicas e pentecostais da região de Burgas, que argumentavam que as autoridades locais tinham violado os seus direitos em 2008 ao publicarem uma circular assinada pelo vice-presidente da Câmara e por outro funcionário dirigida aos diretores das escolas locais, alertando-os para a influência das igrejas, que descreviam como "seitas religiosas perigosas". O TEDH condenou a Bulgária, considerando que a carta constituía uma violação inadmissível da liberdade religiosa.
Até outubro de 2023 foram proferidas nove decisões judiciais que rejeitaram as reivindicações do Gabinete do Grande Mufti relativamente a propriedades como mesquitas, escolas e terrenos confiscados pelo antigo Governo comunista. A questão do reconhecimento do sucessor legítimo de todas as comunidades muçulmanas anteriores a 1949, que determinaria o resultado desses processos de restituição, continua por resolver.[25] Em junho de 2023, o Tribunal Regional de Kyustendil recusou um pedido de restituição da mesquita da cidade.
As Testemunhas de Jeová contestaram uma portaria local que proíbe certas formas de expressão religiosa e proselitismo porta a porta, que o município de Shumen descreveu como “propaganda religiosa nas casas das pessoas”.[26] Em 2021, o Supremo Tribunal Administrativo decidiu que a Lei das Denominações Religiosas permitia qualificações para expressões públicas de fé e considerou que as limitações relacionadas com a privacidade, a vida doméstica e familiar representavam um meio proporcional e, por conseguinte, legal de restringir a liberdade religiosa.[27] Em 2024, as Testemunhas de Jeová apresentaram um recurso ao TEDH contestando a decisão do Supremo Tribunal Administrativo.[28]
Foram registrados poucos casos de vandalismo ou outros ataques com base na religião. Um incidente isolado foi a profanação do túmulo do Patriarca Neófito da Igreja Ortodoxa Búlgara em abril de 2024.[29]
Perspectivas para a liberdade religiosa
Nos últimos dois anos registrou-se uma melhoria do clima cultural e político que, por sua vez, melhorou as perspectivas para a liberdade religiosa. No entanto, a interferência injustificada na autonomia da Igreja continua a ser objeto de contestação por parte do Governo e das autoridades locais, dando origem a litígios e a decisões judiciais desfavoráveis. A interferência do Parlamento em nome da Igreja Ortodoxa Búlgara, definindo-a como a única instituição autorizada a representar a fé ortodoxa, é infelizmente mais um exemplo de um padrão de comportamento deste tipo. Apesar das proteções constitucionais, bem como de inúmeras sentenças do TEDH contra a Bulgária por violação da liberdade religiosa, as autoridades locais continuam, por vezes, recusando-se a respeitar o quadro jurídico, impondo as suas próprias restrições.
Notas e Fontes
[1] Bulgaria 1991 (rev. 2015), Constitute Project, https://www.constituteproject.org/constitution/Bulgaria_2015?lang=en (acessado em 6 de janeiro de 2025).
[2] Lei das Denominações Religiosas, Artigo 10, Seção 1 (em búlgaro), Lex.bg, https://lex.bg/laws/ldoc/2135462355 (acessado em 15 de janeiro de 2025).
[3] Direção de Religiões, Conselho de Ministros (em búlgaro), http://veroizpovedania.government.bg/docs (acessado em 6 de janeiro de 2025).
[4] “Bulgaria”, Freedom in the World 2024, Freedom House, https://freedomhouse.org/country/bulgaria/freedom-world/2024 (acessado em 6 de janeiro de 2025).
[5] Robert Clarke (ed.), The Conscience of Europe? Navigating Shifting Tides at the European Court of Human Rights, Kairos, Viena, 2017, p. 192. Ver também nota xi.
[6] Artigo 30, Seção 2 da Lei das Denominações Religiosas, adoptada em janeiro de 2019. Ver também Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, “Bulgaria”, 2022 Report on International Religious Freedom, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2022-report-on-international-religious-freedom/bulgaria/ (acessado em 4 de fevereiro de 2025).
[7] “Law on Amendments and Supplements to the Law on Religions”, Parlamento, Jornal Oficial do Estado (em búlgaro), https://dv.parliament.bg/DVWeb/showMaterialDV.jsp;jsessionid=B7D200052CEC0906F5ABE89C411D5B00?idMat=232708 (acessado em 4 de fevereiro de 2025). Ver também Lyubomir Gigov, “Three Bills Amending Religious Denominations Act Pass on First Reading”, Bulgarian News Agency (BTA), 9 de janeiro de 2025, https://www.bta.bg/en/news/bulgaria/811734-all-three-bills-amending-religious-denominations-act-pass-on-first-reading (acessado em 15 de janeiro de 2025).
[8] “The General Prosecutor’s Office stands in support of the Patriarchate of Bulgaria”, Orthodox Times, 23 de janeiro de 2025, https://orthodoxtimes.com/the-general-prosecutors-office-stands-in-support-of-the-patriarchate-of-bulgaria/ (acessado em 4 de fevereiro de 2025).
[9] “Law on Amendments and Supplements to the Law on Religions”, op. cit.
[10] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, “Bulgaria, 2023 Report on International Religious Freedom, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2023-report-on-international-religious-freedom/bulgaria/ (acessado em 4 de fevereiro de 2025).
[11] Lyubomir Gigov, “UPDATED Patriarch Daniil: ‘There Is Only One Orthodox Church’”, Bulgarian News Agency (BTA), 29 de dezembro de 2024, https://www.bta.bg/en/news/culture/806936-patriarch-daniil-there-is-only-one-orthodox-church. (acessado em 15 de janeiro de 2025).
[12] Simeon Groysman, “The Bulgarian Constitutional Order and the Problem of ‘Alternative Orthodox Communities’” (em búlgaro), Lex, 2 de janeiro de 2025, https://news.lex.bg/Българският-конституционен-ред-и-проблемът-за-алтернативните-православни-общности (acessado em 15 de janeiro de 2025).
[13] “Case of Bulgarian Orthodox Old Calendar Church and Others V. Bulgaria”, Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, 20 de abril de 2021, https://laweuro.com/?p=14422 (acessado em 7 de janeiro de 2025).
[14] Teodora Tsaneva, “The Registry Agency has refused registration of the ‘Bulgarian Orthodox Old Calendar Church’, tomorrow the deadline for appealing the refusal expires”, (em búlgaro) Bulgarian News Agency (BTA), 9 de janeiro de 2025, https://www.bta.bg/bg/news/bulgaria/811641-agentsiyata-po-vpisvaniyata-e-otkazala-registratsiya-na-balgarska-pravoslavna-s (acessado em 9 de janeiro de 2025).
[15] “Decision No. 214 Of 16.12.2024”, Supremo Tribunal de Cassação da República da Bulgária, Câmara Comercial, Segunda Secção, Processo n.º 563/2022.3 (em búlgaro) https://www.vks.bg/pregled-akt.jsp?type=ot-delo&id=CBEA2A91E009B2A8C2258BF50043C5FB (acessado em 9 de janeiro de 2025).
[16] Nelly Zheleva, "With a large majority, the deputies adopted at first reading all three bills for amendments to the Law on Religious Denominations” (em búlgaro) Bulgarian News Agency (BTA), 9 de janeiro de 2025, https://www.bta.bg/bg/news/bulgaria/811686-s-golyamo-mnozinstvo-deputatite-prieha-na-parvo-chetene-i-trite-zakonoproekta-za (acessado em 9 de janeiro de 2025).
[17] Desislava Antova, “The position of the Council of Ministers is constant, the Bulgarian Orthodox Church is one and indivisible, said Dimitar Glavchev” (em búlgaro), Bulgarian News Agency (BTA), 9 de janeiro de 2025, https://www.bta.bg/bg/news/bulgaria/811575-pozitsiyata-na-ministerskiya-savet-e-konstantna-balgarskata-pravoslavna-tsarkva (acessado em 9 de janeiro de 2025).
[18] “Case of Holy of the Bulgarian Orthodox Church (Metropolitan Inokentiy) v Bulgaria”, Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (ECHR), 22 de janeiro de 2009, https://hudoc.echr.coe.int/eng?i=001-90788 (acessado em 31 de janeiro de 2025).
[19] Case of Hasan and Chaush v Bulgaria”, Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (ECHR), 26 de outubro de 2000, https://hudoc.echr.coe.int/eng?i=001-58921 (acessado em 31 de janeiro de 2025).
[20] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, “Bulgaria”, 2023 International Religious Freedom Report, Departamento de Estado Norte-Americano, htt OR https://www.state.gov/reports/2023-report-on-international-religious-freedom/bulgaria/ (acessado em 6 de janeiro de 2025).
[21] Relatórios do pastor da igreja “New Creation”, Plamen Samuilov.
[22] Entrevista pessoal: Anatoliy Elenkov, reitor do instituto de ensino, 7 de janeiro de 2025, “3 Decades Later: Evangelical Education in Bulgaria at Halt”, Cup and Cross Ministries, 20 de setembro de 2023, https://cupandcross.com/3-decades-later-evangelical-education-in-bulgaria-at-halt/ (acessado em 12 de maio de 2025).
[23] Louis Knuffke, “Court rules Bulgarian gov’t violated Christians’ rights by calling them ‘dangerous religious sects’”, LifeSite, 23 de dezembro de 2023, https://www.lifesitenews.com/news/court-rules-bulgarian-govt-violated-christians-rights-by-calling-them-dangerous-religious-sects/ (acessado em 15 de janeiro de 2025).
[24] “Tonchev and Others v. Bulgaria”, Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (ECHR), dezembro de 2022, https://hudoc.echr.coe.int/fre#{%22itemid%22:[%22002-13934%22]} (acessado em 7 de maio de 2025).
[25] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, 2023, op.cit.
[26] “Ordinance No. 1 of the Municipality of Shumen on the maintenance and protection of public order”, (em búlgaro), Conselho Municipal de Shumen, https://obs.shumen.bg/doc/naredbi/200608.pdf (acessado em 9 de janeiro de 2024).
[27] “Решение №5823 от 14.05.2021 г. на Върховния административен съд на Република България, Трето отделение, по адм. дело № 7702/2020”.
[28]“Krasimir Dinchev VELEV and Others against Bulgaria”, Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (ECHR), 4 de março de 2024, https://hudoc.echr.coe.int/#{%22itemid%22:[%22001-231625%22]} (acessado em 9 de janeiro de 2024).
[29] Observatório de Intolerância e Discriminação contra os Cristãos na Europa, “Grave of Late Patriarch Neophyte Desecrated”, https://www.intoleranceagainstchristians.eu/index.php?id=12&case=7827 (acessado em 4 de fevereiro de 2025).