Liechtenstein
(religiões no país)
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Disposições legais em relação à liberdade religiosa e aplicação efetiva
O Liechtenstein é uma monarquia constitucional hereditária com uma forma de governo democrática e parlamentar, chefiada pelo Príncipe do Liechtenstein (artigo 2.º).[1]
A Constituição garante a liberdade de crença e de consciência (artigo 37.º, n.º 1), de expressão (artigo 40.º), de associação (artigo 41.º) e de reunião (artigo 41.º), bem como a igualdade de direitos perante a lei (artigo 31.º, n.º 1). A Igreja Católica Romana é a “Igreja do Estado” e, como tal, “goza da plena proteção do Estado”, mas as outras religiões têm o direito de “praticar os seus credos e realizar serviços religiosos” (artigo 37.º, n.º 2). Os direitos civis e políticos não dependem da crença religiosa e ninguém pode negligenciar os seus deveres cívicos por motivos religiosos (artigo 39.º).
Não existe nenhuma lei que obrigue os grupos religiosos a registrarem-se junto das autoridades estatais. Os grupos religiosos têm liberdade para estabelecer associações privadas, para as quais é obrigatório um registro comercial. Caso se registrem como tal, são elegíveis a receber financiamento público para uma variedade de atividades, incluindo a disponibilização de educação religiosa nas escolas.[2]
A educação religiosa é obrigatória nas escolas públicas primárias e secundárias.[3]
Os pais podem optar pela educação religiosa católica ou protestante reformada ou, mediante pedido formal às autoridades escolares, por uma disciplina secular denominada “Ética e Religiões”. A educação religiosa islâmica é disponibilizada como disciplina opcional na escola primária. Os professores do ensino religioso católico, protestante reformado e islâmico são assegurados pelas respectivas comunidades religiosas, mas os seus salários são pagos total ou parcialmente pelo Ministério da Educação.[4]
O Código Penal do Liechtenstein proíbe o incitamento ao ódio ou à discriminação dos grupos religiosos ou indivíduos sob diferentes formas, tal como previsto na sua seção 8 sobre "Infrações contra a paz religiosa e a paz dos mortos".[5] O Código Penal também proíbe (artigo 283.º, n.º 6 e 7) a recusa em servir uma pessoa ou grupo de pessoas com base na filiação religiosa e a participação como membro em qualquer associação que pretenda promover a discriminação dos grupos religiosos ou indivíduos.
O abate de animais sem atordoamento é igualmente proibido por lei, o que torna ilegal o ritual de abate de animais para obtenção de carne kosher e halal (artigo 20.º, n.º 1 e 2 da Lei da Proteção dos Animais).[6] No entanto, a importação de carne kosher ou halal é legal.[7]
Uma vez que é a religião do Estado, a Igreja Católica Romana recebe benefícios do governo e dos municípios, variando o montante consoante o município. Os sacerdotes são classificados como funcionários municipais. O governo e os municípios também apoiam financeiramente a Igreja Evangélica Reformada e a Igreja Evangélica Luterana.[8] As outras comunidades religiosas operam exclusivamente ao abrigo do direito privado e recebem financiamentos de montantes variáveis mediante candidatura. O apoio aos grupos islâmicos está condicionado à criação de uma organização de cúpula. Ainda não existem cemitérios para muçulmanos e não cristãos.[9] De acordo com o Relatório de Monitoria de 2023 da Associação para os Direitos Humanos no Liechtenstein, a igualdade de tratamento da religião ainda não é totalmente garantida pelo Estado.[10]
Este sistema encontra-se atualmente numa fase de transformação. Desde a criação da Arquidiocese de Vaduz, em 1998, que a separação entre a Igreja e o Estado está sendo discutida.[11] Em maio de 2023, foi proposto um projeto de lei intitulado “Lei das Comunidades Religiosas” para garantir a igualdade de tratamento de todas as religiões.[12] Em 2012, foi aprovada uma lei semelhante que, na prática, deveria ter alcançado esse resultado, mas que nunca foi implementada devido ao fracasso das negociações entre o Estado e a Arquidiocese.[13] Atualmente, a tentativa de separação completa entre o Estado e a Igreja foi abandonada e o objetivo é valorizar o estatuto de todas as comunidades religiosas sem alterar o estatuto da Igreja Católica como Igreja nacional.[14] As Igrejas Protestantes e Evangélicas Luteranas devem ser diretamente reconhecidas como empresas públicas. Outras comunidades religiosas podem ser reconhecidas, sob certas condições.[15] Em 2024, o partido da oposição Freie Liste voltou a exigir, numa iniciativa parlamentar, a separação total entre a Igreja e o Estado. No entanto, o governo rejeitou esta proposta.[16]
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Incidentes e episódios relevantes
A Associação dos Direitos Humanos do Liechtenstein (Verein für Menschenrechte, VMR) é uma organização independente sem fins lucrativos, cujo objetivo é proteger e promover os direitos humanos no principado.[17] No seu último relatório (setembro de 2023), identificou quatro casos de discriminação em 2023, todos eles relacionados com a origem das pessoas envolvidas e não explicitamente com a sua religião.[18] No entanto, de acordo com o Gabinete das Instituições Democráticas e dos Direitos Humanos (ODIHR), o principado do Liechtenstein não recolhe dados específicos sobre crimes de ódio. O relatório de 2023 do ODIHR afirma que a proibição da discriminação prevista no Código Penal do país não corresponde à sua definição de crime de ódio, nem são registradas as motivações preconceituosas, pelo que esta variável não é apropriada para medir e combater adequadamente a discriminação. Por conseguinte, o ODIHR insta as autoridades locais a adotarem legislação mais ampla sobre a discriminação e os crimes de ódio.[19]
Em maio de 2023, o governo do Liechtenstein propôs uma nova Lei das Comunidades Religiosas para estabelecer a igualdade entre as comunidades religiosas através do reconhecimento estatal. A legislação visa introduzir critérios para o registro das comunidades religiosas e procura modernizar o quadro constitucional existente para as religiões. Atualmente, a Igreja Católica é a Igreja do Estado, enquanto as outras comunidades religiosas são definidas como associações privadas. Esta disparidade não reflete a atual paisagem religiosa do Liechtenstein e parece incoerente com as normas internacionais, como a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), que impõe a não discriminação em matéria religiosa.[20]
Os muçulmanos continuam a ser alvo de discriminação, especialmente nos casos relatados por mulheres muçulmanas que usam lenço na cabeça e que procuram emprego e habitação.[21] A Comunidade Islâmica do Principado do Liechtenstein (Islamische Gemeinschaft im Fürstentum Liechtenstein, IGFL), uma das associações islâmicas do país, continua a exigir a criação de um cemitério islâmico para servir a população muçulmana, bem como o estabelecimento de uma segunda sala de oração islâmica para satisfazer as necessidades crescentes da comunidade. Em setembro de 2021, o Parlamento aprovou por unanimidade a petição de Akif Özmen e Hamit Örgen relativa à “igualdade de direitos dos muçulmanos no Liechtenstein”, que incluía também o pedido de um cemitério muçulmano. O governo transmitiu a petição aos municípios, que estão atualmente a avaliar as possibilidades a este respeito.[22]
Perspectivas para a liberdade religiosa
A relação constitucional entre o Estado e as comunidades religiosas no Liechtenstein está atualmente atravessando um período de transformação. Resta saber que soluções políticas serão propostas num futuro próximo para garantir a igualdade de tratamento entre as diferentes religiões sem eliminar as legítimas características históricas, culturais e sociais do principado do Liechtenstein.
O fato de o Liechtenstein não comunicar os incidentes de ódio relacionados com a religião ou crença constitui um obstáculo à obtenção de uma imagem real da situação. No entanto, a liberdade religiosa no principado está geralmente garantida e as perspectivas de aplicação deste direito continuam positivas.
Notas e Fontes
[1] “Liechtenstein 1921 (rev. 2011)”, Constitute Project, https://www.constituteproject.org/constitution/Liechtenstein_2011?lang=en (acessado em 6 de novembro de 2024).
[2] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, “Liechtenstein”, 2023 Report on Religious Freedom, Departamento de Estado Norte-Americano, https://www.state.gov/reports/2023-report-on-international-religious-freedom/liechtenstein/ (acessado em 14 de dezembro de 2024).
[3] Ibid.
[4] Ibid.
[5] Para as versões alemã e inglesa, ver Códigos penais do Liechtenstein, Legislation online, https://legislationline.org/Liechtenstein (acessado em 14 de dezembro de 2024).
[6] „Tierschutzgesetz (TSchG) vom 23. September 2010“, Liechtensteinisches Landesgesetzblatt, 16 de novembro de 2010, https://www.gesetze.li/konso/html/2010333000?version=3&search_text=&search_loc= (acessado em 14 de dezembro de 2024).
[7] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, op. cit.
[8] Ibid.
[9] „Monitoringbericht 2023, Verein für Menschenrechte in Liechtenstein VMR“, p. 15, https://www.menschenrechte.li/wp-content/uploads/2024/06/2023-Monitoringbericht.pdf (acessado em 19 de setembro de 2024).
[10] Ibid.
[11] „Vernehmlassungsbericht der Regierung, Betreffend die Abänderung der Verfassung und die Schaffung eines Gesetzes über die Staatlich Anerkannten Religionsgemeinschaften (Religionsgemeinschaftengesetz; Relgg) Sowie die Abänderung Weiterer Gesetze“, Ministério dos Assuntos Gerais e das Finanças, 18 de setembro de 2023, p. 8, https://www.llv.li/serviceportal2/amtsstellen/stabstelle-regierungskanzlei/vnb_relgg.pdf (acessado em 11 de dezembro de 2024).
[12] "Liechtenstein: Regierung will neues Religionsgemeinschaftengesetz", Vatican News, 11 de maio de 2023, https://www.vaticannews.va/de/kirche/news/2023-05/liechtenstein-regierung-plan-neu-religionsgemeinschaftengesetz.html (acessado em 14 de dezembro de 2024).
[13] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, op. cit.
[14] „Vernehmlassungsbericht der Regierung“, p. 5, op. cit.
[15] Ibid., pp. 5-6.
[16] „Monitoringbericht 2023 Verein für Menschenrechte in Liechtenstein VMR“, op. cit.; Günther Meier, “Trennung von Kirche und Staat? Doch nicht in Liechtenstein!”, Neue Zürcher Zeitung, 8 de julho de 2024, https://www.nzz.ch/schweiz/trennung-von-kirche-und-staat-doch-nicht-in-liechtenstein-ld.1837770 (acessado em 15 de setembro de 2024).
[17] „Verein für Menschenrechte VMR (Liechtenstein)“, humanrights.ch https://www.humanrights.ch/de/ipf/initiativen-parlament/nmri/portraits/verein-menschenrechte-liechtenstein (acessado em 6 de novembro de 2024).
[18] “Monitoringbericht 2023”, op. cit.
[19] Gabinete das Instituições Democráticas e dos Direitos Humanos, “2023 Hate Crime Reporting – Liechtenstein”, Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa, https://hatecrime.osce.org/liechtenstein (acessado em 11 de dezembro de 2024).
[20] „Vernehmlassungsbericht der Regierung“, op. cit.
[21] Gabinete para a Liberdade Religiosa Internacional, op. cit.
[22] “Muslimischer Friedhof im Nahbereich Naturschutzgebiet Schwabbrünnen”, Landtag des Fürstentums Liechtenstein, https://www.landtag.li/printkleineanfrage/27117/?t=638486489350201812 (acessado em 3 de dezembro de 2024).