Mapa da região

Perseguição religiosa
Discriminação religiosa
Sem registros

Durante o período em análise, a África continuou sendo a região mais afetada pela atividade jihadista. A violência não provém de uma única entidade, mas de uma rede descentralizada de movimentos filiados que operam de forma autônoma, mas partilham ideologia, táticas e recursos. Esses movimentos exploram fronteiras frágeis e governos desestruturados para se expandirem entre regiões, formando uma estrutura pouco coordenada. Apesar da sua independência, trocam armas e combatentes, aumentando a sua resiliência e alcance. A sua adaptabilidade teve consequências devastadoras para os civis, incluindo as comunidades cristãs. Este modelo transnacional e flexível permite que os agentes jihadistas prosperem no meio de uma instabilidade contínua.

De acordo com o Centro Africano de Estudos Estratégicos, os grupos extremistas islamistas continuam sendo uma grande fonte de instabilidade em cinco regiões do continente. Só em 2024, esses grupos foram responsáveis ​​por 22.307 mortes.

Escalada da violência jihadista no Sahel

O Sahel ainda é a região do mundo mais afetada pelo terrorismo e pela violência jihadista, sendo responsável por mais de metade de todas as mortes relacionadas com o terrorismo em 2024. Como é noticiado no Índice Global de Terrorismo 2025, cinco dos dez países mais impactados pelo terrorismo estão nesta região — Burkina Faso, Mali, Níger, Nigéria e Camarões — destacando-se o seu lugar central na atual onda de violência extremista.

Burkina Faso continuou sendo o país mais atingido globalmente em 2024, sendo responsável por 20% de todas as mortes relacionadas com o terrorismo, apesar de uma queda de 21% em relação ao ano anterior. Desde 2015, a violência jihadista tem aumentado, transformando o país, outrora um modelo de harmonia religiosa, no epicentro da atividade extremista no Sahel. Grupos como o JNIM, afiliados ao autoproclamado grupo Estado Islâmico e o Ansarul Islam têm como alvo as comunidades muçulmanas e cristãs, e atacam frequentemente locais de culto. Os líderes religiosos foram sequestrados ou mortos, e as comunidades cristãs foram deslocadas ou proibidas de praticar a sua religião em público. Em meados de 2024, quase 100 cristãos foram mortos na região de Zekuy-Doumbala.

O Mali sofreu um declínio constante na segurança e nos direitos fundamentais, tornando-se um dos países mais afetados pelo terrorismo no mundo. A crise começou em 2012, quando a infiltração de grupos extremistas no norte do Mali reacendeu a rebelião tuaregue. Representando cerca de 10% da população, os tuaregues, por meio do Movimento Nacional para a Libertação de Azawad (MNLA), procuraram a autonomia no norte e aliaram-se temporariamente a grupos islamistas como o AQMI, MUJAO e Ansar Dine para expulsar as forças governamentais. O acordo de paz de 2015 entrou em colapso desde então. A retirada das forças de manutenção da paz da ONU em 2023 e o envio de mercenários russos do Grupo Wagner agravaram ainda mais a crise. A violência jihadista intensificou-se por todo o país, com civis — incluindo cristãos — sofrendo sequestros, abusos e a imposição de regras religiosas. Em 2024, a junta militar suspendeu a atividade política e reprimiu a dissidência. A situação continua crítica, com temores de conflito civil e contínuas violações dos direitos humanos.

O Níger enfrentou um declínio acentuado em termos de segurança, governança e direitos humanos sob a liderança da junta militar chefiada pelo general Abdourahamane Tchiani. Uma Carta de Transição adotada em março de 2025 deu início a uma transição de 60 meses, protegendo formalmente a liberdade religiosa, mas em um contexto cada vez mais volátil. A nação tornou-se um importante foco jihadista, com o ISSP, filiados da Al-Qaeda e o Boko Haram ativos em todo o país. A região de Tillabéri, próxima do Mali e de Burkina Faso, continua sendo o epicentro dos ataques. Em 2024, o Níger registrou um aumento de 94% de mortes relacionadas com terrorismo, o maior aumento do mundo. Tanto as comunidades muçulmanas como as cristãs sofreram com ataques a igrejas, mesquitas e encontros religiosos, bem como sequestros de líderes. Houve alguns esforços de diálogo inter-religioso, mas as redes radicais, a fragilidade institucional e o autoritarismo corroeram o espaço civil e a resiliência. As minorias cristãs continuam especialmente em risco, enfrentando ameaças, conversões forçadas e restrições ao culto.

Em julho de 2024, o Mali, Burkina Faso e o Níger formalizaram uma aliança por meio do estabelecimento da Confederação dos Estados do Sahel (CSS), após a sua retirada coordenada da CEDEAO. Essa evolução assinala um realinhamento mais amplo, afastando-se das instituições ocidentais, à medida que esses regimes liderados por militares reforçam as suas parcerias com a Rússia e a China.

Golpes de Estado, eleições e alterações constitucionais: uma mudança no governo

Entre 2023 e 2025, a África Subsaariana viveu uma onda de golpes de Estado e de revisões constitucionais que refletiram crises de governo mais profundas e tiveram frequentemente consequências diretas na liberdade religiosa. Durante esse período ocorreram dois golpes de Estado bem-sucedidos (Níger e Gabão) e diversas tentativas fracassadas (Burkina Faso, Guiné-Bissau e República Democrática do Congo).

Outros países adotaram ou propuseram reformas constitucionais significativas, muitas das quais geraram controvérsia ou tiveram consequências adversas. Na República Centro-Africana, um referendo em 2023 aboliu os limites de mandato e criou uma vice-presidência, permitindo ao presidente Touadéra candidatar-se a um terceiro mandato em dezembro de 2025. O referendo de dezembro de 2023 no Chade reintroduziu um sistema semipresidencialista, um primeiro-ministro, um senado e uma comissão de direitos humanos, embora a responsabilização permaneça incerta. No final de 2024 foi promulgada uma nova constituição no Gabão e o governo lançou um diálogo nacional para revitalizar as suas instituições democráticas após 54 anos sob a dinastia Bongo. Em março de 2024, o Parlamento do Togo aprovou uma nova Constituição que, segundo os críticos, enfraquece a democracia, fazendo a transição do país para um sistema parlamentar e eliminando efetivamente os limites de mandatos para o presidente Gnassingbé, que está no poder desde 2005.

Em 2024 estavam previstas eleições em 19 países africanos, mas muitas foram adiadas, manipuladas ou realizadas em condições autoritárias. Os regimes militares em Burkina Faso, Mali, Guiné e Guiné-Bissau não cumpriram as suas promessas de transição democrática, ao mesmo tempo que se realizaram grandes eleições nacionais na Mauritânia, Chade, Senegal e Togo. Na África do Sul, os bispos católicos descreveram o processo eleitoral como “extremamente livre e justo”.

O Chifre da África: guerras civis, violência religiosa e contágio regional

O Chifre da África continua profundamente instável, com guerras civis sobrepostas, ameaças extremistas e tensões transfronteiriças.

Desde abril de 2023 que o Sudão vive uma guerra civil entre as Forças Armadas Sudanesas e as Forças de Apoio Rápido, desencadeando a maior crise de deslocamento do mundo, com quase 13 milhões de pessoas desalojadas. Ambas as facções bombardearam locais religiosos, torturaram clérigos e transformaram igrejas e mesquitas em bases militares. Os cristãos têm sofrido conversões forçadas, detenções arbitrárias e ataques violentos à medida que a liberdade religiosa se deteriora drasticamente.

A violência afetou o Sudão do Sul, onde o fluxo de refugiados e a violência étnica retaliatória desestabilizaram o frágil processo de paz do país. O governo de transição adiou as eleições e está a lutando para redigir uma constituição permanente.

A situação na Somália continua crítica. O Al-Shabaab controla grandes áreas rurais e impõe uma versão extrema da sharia, proibindo o culto cristão, punindo a apostasia com a morte e atacando todos os “não islâmicos”. Os cristãos convertidos devem praticar a religião em segredo, correndo o risco de serem vítimas de violência, detenção ou morte. O autoproclamado grupo Estado Islâmico da Somália está também se expandindo, sobretudo na Puntlândia, aumentando a instabilidade. As tensões com a Etiópia e a Somalilândia, combinadas com o fluxo de armas e os conflitos internos entre clãs, prejudicam ainda mais os esforços para travar a violência jihadista.

Depois da Somália, o Quênia tem sido o país mais afetado pela violência ligada ao al-Shabaab. Considerado durante muito tempo como um estabilizador regional, o Quênia tem sofrido com ataques transfronteiriços e tensões religiosas internas. Em 2023 e 2024 foram registrados dezenas de ataques nos condados de Mandera, Lamu e Garissa, visando civis, incluindo cristãos. Ao mesmo tempo, a discriminação contra os muçulmanos continuou sendo uma fonte de tensão. Em fevereiro de 2025, o presidente William Ruto aboliu o sistema de verificação imposto aos muçulmanos que solicitavam documentos de identificação nacional, uma medida bem-vista pela sociedade civil como um passo para reduzir a marginalização. Apesar desses desafios, as relações inter-religiosas em todo o país permaneceram, em grande parte, pacíficas.

A liberdade religiosa na Etiópia continua precária, em meio a conflitos persistentes e instabilidade política. A violência contínua em Tigré, Oromia e Amhara afetou gravemente as comunidades religiosas, levando à destruição de locais de culto, ao assassinato de clérigos e à interrupção de atividades religiosas. A interseção das identidades religiosas e étnicas minou ainda mais a coesão inter-religiosa. No âmbito regional, a cooperação antiterrorista tem sido pressionada devido às tensões com o governo somali, tensões exacerbadas pelo acordo da Etiópia com a Somalilândia.

Em todo o Chifre da África, a liberdade religiosa é ameaçada não só pela violência jihadista, mas também pela repressão estatal. Na Eritreia, a política governamental criminaliza eficazmente a prática religiosa não autorizada, com os dissidentes enfrentando a prisão arbitrária, a tortura e a detenção prolongada. Cristãos, testemunhas de Jeová e muçulmanos, incluindo menores e clérigos, são alvos rotineiros. Os encontros religiosos são proibidos e os detidos são mantidos em condições desumanas e com superlotação, sem o devido processo legal. Sob o regime autoritário da Eritreia, as condições para a liberdade religiosa permanecem extremamente precárias.

Nigéria: Comunidades religiosas sob ataque

A Nigéria assistiu a um aumento da violência com motivação religiosa entre janeiro de 2023 e dezembro de 2024, particularmente no norte e no Cinturão Médio. Grupos armados como o Boko Haram, o grupo Estado Islâmico da Província da África Ocidental (ISWAP) e várias milícias realizaram ataques em grande escala contra igrejas, aldeias e líderes religiosos. Nos estados de Plateau e Benue, milhares foram deslocados e centenas foram mortos, incluindo mais de 1.100 cristãos, entre eles 20 clérigos, em apenas um mês após a posse presidencial de 2023. Durante o Natal de 2023, ataques coordenados por extremistas locais e estrangeiros deixaram quase 300 mortos. Em junho de 2025, cerca de 200 cristãos deslocados foram massacrados em Benue.

Pastores fulani extremistas continuam envolvidos em ataques contra comunidades cristãs, envolvendo frequentemente apropriação de terras e deslocamentos. Enquanto alguns analistas enquadram o conflito em termos ambientais, os líderes da Igreja local o descreveram como uma estratégia deliberada para expulsar as populações cristãs. Em maio de 2024, uma escola secundária cristã foi atacada em Makurdi,90 em uma escalada sem precedentes. Acusações de blasfêmia e assassinatos relacionados com bruxaria somaram-se ao número de vítimas, incluindo linchamentos públicos.

Líderes religiosos e os clérigos foram alvos frequentes, com dezenas de sequestros ou assassinatos. Os grupos islamistas também entraram em confronto com as autoridades, como durante a repressão policial mortal a uma procissão xiita em Abuja. Enquanto isso, a polícia religiosa (hisbah) continuou aplicando restrições baseadas na sharia em vários estados do norte, apesar das proibições constitucionais federais.

África Central e África Meridional: frentes emergentes

A República Democrática do Congo vive uma das mais graves e multifacetadas crises da África Subsaariana. Grupos armados como as Forças Democráticas Aliadas (ADF), filiadas ao autoproclamado grupo Estado Islâmico, têm atacado sistematicamente as comunidades cristãs, matando civis, destruindo locais de culto e sequestrando clérigos. Nas províncias orientais, mais de 120 milícias competem pelo controle das áreas ricas em minerais, enquanto o colapso dos serviços públicos e a fraca presença do Estado deixam as comunidades religiosas particularmente expostas. O conflito transcende as fronteiras nacionais: o grupo rebelde M23, apoiado pelo Ruanda, e as operações militares do Uganda contra as ADF demonstram a extensão do envolvimento regional. Em janeiro de 2025, o M23 capturou Goma, o que resultou em muitas vítimas civis e deslocamentos em grande escala. As Igrejas empenhadas na defesa da paz enfrentaram retaliações por parte das autoridades estatais. À medida que a violência aumenta e as comunidades religiosas perdem o acesso a espaços seguros e a proteções básicas, as condições para a liberdade religiosa no leste da República Democrática do Congo continuam a se deteriorar, ameaçando a estabilidade geral em toda a região dos Grandes Lagos.

Moçambique tem assistido a um novo aumento da violência jihadista em Cabo Delgado, onde extremistas filiados ao autoproclamado grupo Estado Islâmico continuam atacando comunidades cristãs, queimando igrejas e a matando civis. Apesar da presença de forças militares internacionais, os insurgentes expandiram-se para novos distritos, aproveitando o fraco controle estatal e as lacunas do governo. Neste contexto, as comunidades religiosas, em particular a Igreja Católica, permaneceram ativamente empenhadas na promoção da paz e do diálogo inter-religioso. A Declaração Inter-religiosa de Pemba, assinada em 2022 por líderes cristãos e muçulmanos, reafirmou o seu compromisso partilhado de prevenir a instrumentalização da religião. Em 2024, o Conselho Islâmico de Moçambique sinalizou a sua vontade de mediar com os jihadistas. Esses esforços sublinham a resiliência dos agentes religiosos face à crescente insegurança.

Migrações

Outra questão crítica que afeta a África Subsaariana é o forte aumento dos deslocamentos e migrações, tanto dentro como entre fronteiras nacionais. Até o final de 2024, a região abrigava 38,8 milhões de deslocados internos, quase metade do total global. Na África Oriental, no Chifre da África e nas regiões dos Grandes Lagos, foram registrados 5,4 milhões de refugiados e requerentes de asilo. A migração transfronteiriça dentro do continente também aumentou, com o número de africanos residindo em outros países africanos passando de 12 milhões em 2015 para 15 milhões em 2024, um aumento de 25%.