Numa entrevista para a Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), Dom Cyr-Nestor Yapaupa, bispo auxiliar de Alindao, nos confia a sua preocupação pelas próximas eleições em 18 de outubro, ao mesmo tempo em que ressalta os sinais de esperança para a crise, perto da visita do Papa no final de novembro.

Qual é a situação da República Centro Africana com relação à segurança?

Na capital e em algumas grandescidades, graças à presença das forças da ONU, a segurança está novamente garantida. Por outro lado, nas demais cidades e na zona rural, a situação se apresenta mais difícil para a população. Ali ainda operam grupos armados e os membros das milícias “anti-Balaka” continuam cometendo assaltos e outros excessos, como, por exemplo, em minha diocese, onde puseram fogo num povoado inteiro há pouco mais de um mês.

Nós, os bispos, continuamos a exigir o desarmamento, mas nem o governo, nem as forças da ONU estão investindo muitos esforços neste sentido. Porém, a situação não poderá evoluir se não se trabalhar por um desarmamento.

As eleições estão previstas para o próximo dia 18 de outubro. O que o Senhor pensa sobre elas?

Atualmente, ainda temos um governo de transição e estamos a espera das eleições. Porém, nós nos perguntamos se existem condições necessárias para elas. Realmente é o caso de se levar a cabo eleições quando ainda se tem de enviar homens armados para as zonas ocupadas para se fazer a conferência das listas eleitorais? Por acaso nós estamos em condições de realizar eleições, em condições normais? Esta é a pergunta que todo mundo se faz, pois vai ser muito difícil. A MINUSCA (Missão das Nações Unidas para a Estabilização da República Centro Africana) e o governo devem assumir as suas responsabilidades.

E como se sentem os cristãos atualmente?

Isso depende do lugar onde residam, mas, em geral, eles têm esperança. Do ponto de vista da fé, a situação que atravessamos os fez crescer e lhes infundiu muito valor. Nota-se que os cristãos agora estão mais assíduos e mais comprometidos que antes. Com frequência lhes digo: “Perdemos tudo, nos roubaram as coisas materiais, mas não a fé”.

Como estão as relações com os muçulmanos? O Senhor tem visto mudanças de atitude?

Na minha diocese, em geral, nunca houve um confronto entre cristãos e muçulmanos. Com certeza, atualmente se nota uma hesitação na relação com algumas pessoas, mas elas tentam continuar a conviver apesar de tudo. E nós também continuamos a criar plataformas comuns com o imã e os protestantes, isto é, nos reunimos para debater os problemas. Isso tem dado muitos frutos, pois até as autoridades pedem conselho para as nossas plataformas. O fato de caminharmos juntos nos dá mais credibilidade.

No Ocidente se tenta apresentar este conflito como uma guerra entre cristãos e muçulmanos. Qual é a sua opinião sobre isto?

Isto é lamentável, pois este conflito não tem nada de religioso. Confundem os anti-Balaka com milícias cristãs. Mas quando eu vejo seus membros cobertos com os seus talismãs, vejo claramente que não se trata de cristãos. Eu, como cristão, levo o meu crucifixo, mas não talismãs. Da mesma maneira, nem todos os membros do Seleka são muçulmanos. Não se trata de um conflito religioso, mas sim político.

Quais os desafios que enfrenta hoje a Igreja centro africana?

O principal desafio para a Igreja está em restaurar nas pessoas o sentido de sua dignidade humana e, sobretudo, a educação dos jovens. Os jovens são o futuro do país – eles representam 70% da população. Nós precisamos dar um sentido, um significado para as suas vidas. Deste modo nós teremos muito a ganhar, pois será através deles que seremos capazes de reconstruir o país. Também queremos ressaltar a formação humana do laicato, pois daqui para frente serão eles que terão sobre os seus ombros as principais responsabilidades. Serão eles que serão ouvidos muito mais do que antes. Depois disto, teremos que pensar em reconstruir a infraestrutura. Mas, antes de mais nada, será o próprio homem que teremos de reconstruir.

Quais são os sinais concretos de esperança para o futuro?

Eu acho que estamos pouco a pouco saindo da crise. A vida normal está retornando cada vez mais. Algumas vilas que haviam sido abandonadas estão habitadas de novo. Outras tinham barreiras separando as zonas cristãs das muçulmanas, mas agora em algumas delas o movimento entre elas está normalizado. Estes são sinais de esperança. Uma parte dos refugiados está voltando ao país. E para os que ainda estão no exterior, esperamos que as coisas fiquem melhor. Cabe ao governo organizar as coisas para que os que ainda estão no exterior sejam encorajados a voltar para casa.

Quais são as suas esperanças para a visita do Papa de 27 a 29 de novembro deste ano?

Espero que ele possa nos trazer um pouco de um novo ânimo e que consiga acalmar as tensões, para dar uma nova confiança ao povo da África Central. O povo o está aguardando com muita alegria e todos estão participando ativamente dos preparativos. Trata-se de um grande sinal de esperança para nós, pois esta visita demonstra que em meio a todas as nossas dificuldades, o Papa se lembra de nós.

Qual foi a ajuda recente dada pela AIS para a República Centro Africana?

A AIS financiou cinco caminhões que serão usados para o transporte de peregrinos de nove dioceses do país para Bangui, onde se darão os eventos com o Papa (umas 50 pessoas por caminhão). Depois, estes caminhões ficarão nas dioceses, onde serão usados para diferentes atividades. Deste modo, habitantes dos lugares mais remotos do país poderão se reunir com o Papa em Bangui nos dias 27, 28 e 29 de novembro.

Dom Cyr-Nestor Yapaupa, agradece a todos os benfeitores da AIS:

Muitíssimo obrigado em nome da população cristã centro africana! Graças a vocês, não nos sentimos abandonados. Vocês nos apoiaram moral, espiritual e economicamente. Para mim, o apoio de vocês durante os momentos difíceis mostra o seu desejo de compartilhar e de ser um sinal da Igreja”.

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